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quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

XXXX - Dos Sínodos e Concílios

Parte XXXX

Dos Sínodos e Concílios

Comentário do Capítulo XXXI da Confissão de Fé de Westminster


As várias denominações de hoje empregam a palavra “sínodo” de maneiras diferentes. Para nós, os presbiterianos, o sínodo – composto de ministros e presbíteros dos presbitérios – é o grau acima do presbitério e abaixo do supremo concílio (ou assembléia geral) na sua ordem de governo eclesiástico. 


A distinção entre os vocábulos “sínodo” e “concílio” é mais aparente que real; ou seja, assim como o presbitério e o supremo concílio, o sínodo também é um concílio [1]. “Sínodo” ou “Concílio” é uma conferência convocada pelos líderes eclesiásticos para dar orientação à igreja.

Um concílio pode ser ecumênico (geral) e, portanto, representar a igreja inteira, ou pode ser local (particular), tendo representação regional ou local. Por exemplo: Doze concílios regionais reuniram-se para debater a heresia ariana entre os concílios ecumênicos de Nicéia, em 325, e de Constantinopla, em 381. O primeiro concílio ecumênico na história da Igreja foi o de Jerusalém (c. 50 A. D.) e está registrado em Atos 15. Os resultados daquele Concílio foram normativos para toda a igreja cristã primitiva. No entanto, o Concílio de Jerusalém deve ser distinguido dos concílios posteriores, pelo fato de ter tido uma liderança apostólica [2].

A Assembléia de Westminster (1643-1649) foi um dos maiores concílios na história da igreja cristã de origem reformada. O capítulo que passamos a compartilhar é parte integrante da Confissão de Fé, um dos grandes tratados teológicos produzidos por aquela histórica e notável assembléia.

I O propósito dos sínodos e concílios

“Para melhor governo e maior edificação da Igreja, deverá haver as assembléias chamadas sínodos e concílios. Em virtude do seu cargo e do poder que Cristo lhes deu para edificação e não para destruição, pertence aos pastores e aos outros presbíteros das igrejas particulares criar tais assembléias e reunir-se nelas quantas vezes julgarem útil para o bem da Igreja”.

Os sínodos e concílios existem “para melhor governo e maior edificação da igreja”, ou seja, “para o bem da igreja”.
Cristo dotou a igreja do poder necessário para levar a efeito a obra que lhe confiou. Investe todos os membros da igreja com uma certa medida de poder, mas outorga uma medida especial dele aos oficiais da igreja. O governo da igreja presbiteriana pertence aos pastores e presbíteros. Sua autoridade não lhes é delegada pelos membros da igreja, embora a igreja os escolha para o ofício. Enquanto participam do poder geral dado a todos os membros, recebem diretamente de Cristo aquela medida adicional que é exigida para o seu trabalho como oficiais da igreja do Senhor.

O poder governante da igreja reside primariamente nos conselhos locais e destes é passado aos sínodos e concílios. Cada igreja local tem um certo grau de autonomia ou independência, mas este é naturalmente restrito de várias maneiras tão logo ela se associe a outras igrejas locais. Os interesses da igreja em geral não podem ser sacrificados pelos de qualquer igreja local [3].

As assembléias maiores, ou concílios, não representam uma espécie de poder superior do que se investe nos conselhos. É a mesma espécie de poder, mas representado num grau maior. Desde que diversas igrejas são representadas há, naturalmente, uma acumulação de poder. Além disso, as decisões dessas assembléias não são meramente só consultivas, mas obrigatórias, exceto em casos em que sejam explicitamente declaradas somente consultivas. São obrigatórias às igrejas, a menos que sejam demonstradas como contrárias à Palavra de Deus.

II A autoridade dos sínodos e concílios

“Aos sínodos e concílios compete decidir, ministerialmente, controvérsias quanto à fé e casos de consciência; determinar regras e disposições para a melhor direção do culto público de Deus e governo de sua Igreja; receber queixas em caso de má administração e com autoridade decidi-las. Os seus decretos e decisões, sendo consoantes com a Palavra de Deus, devem ser recebidos com reverência e submissão, não só pela sintonia com a Palavra, mas também pela autoridade através da qual são feitos, visto que essa autoridade é uma ordenação de Deus, designada para isso em sua Palavra”.

A autoridade dos sínodos e concílios deve ser segundo a Palavra de Deus. Do contrário correm o risco de ficarem a quem do que se exige deles, ou mesmo de irem além, beirando (ou até praticando) o despotismo e abuso de autoridade.
Segundo Calvino, se queremos saber qual é a autoridade dos concílios segundo a Escritura, não há promessa maior do que a que se encontra nas palavras de Cristo: “Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou eu no meio deles” (Mt 18.20). Isso se aplica não somente a qualquer reunião particular, mas aos concílios em geral. Contudo, não é essa a dificuldade da questão, mas a condição que se adiciona: que Cristo estará no meio do concílio sempre que o mesmo for reunido em seu nome. Cristo não promete nada a não ser para quem esteja reunido em seu nome. O que isso significa?

Não estão reunidos em nome de Cristo os que, sem ter em conta o mandato de Deus, no qual proíbe que se acrescente ou diminua algo à sua Palavra, decretam o que lhes dá na telha; pois estes, não contentes com os oráculos da Escritura, que são a regra da perfeita sabedoria, não cessam de inventar coisas novas. E visto que Jesus Cristo não promete estar presente em todos os concílios, mas tenha posto um sinal particular para diferenciar os verdadeiros dos que não são, não podemos fazer pouco caso dessa diferença. O pacto que Deus fez antigamente com os sacerdotes levitas foi que ensinassem o que ouviam de sua boca (Ml 2.7). Ele também pediu o mesmo aos seus profetas e apóstolos. E àqueles que quebrassem esse pacto Deus não os reconheceria como sacerdotes seus, nem lhes daria autoridade alguma. Resolvam essa dificuldade os adversários, diz Calvino, se desejam que se dê crédito às decisões dos homens tomadas à margem da Palavra de Deus [4].

III A falibilidade dos sínodos e concílios

“Todos os sínodos e concílios, desde os tempos dos apóstolos, quer gerais quer particulares, podem errar, e muitos têm errado; eles, portanto, não devem constituir regra de fé e prática, mas podem ser usados como auxílio em uma e outra coisa”.

Todos os sínodos e concílios podem errar, e muitos têm errado no decorrer da história porque são formados por homens que podem e têm errado [5]. Isso, porém, explica, mas não justifica uma decisão conciliar equivocada.

Uma decisão conciliar equivocada é aquela que resulta em algum prejuízo para a igreja. O concílio não é a igreja, mas o seu representante. Uma igreja pode ser bem ou mal representada. Qualquer resolução do concílio, seja ela boa ou má, vai refletir primeiramente na igreja representada por ele. A igreja é o termômetro das resoluções de um concílio. O Novo Testamento é muito claro nisso. Após a decisão do primeiro concílio da Igreja – que se reuniu com o propósito de opor-se aos esforços judaizantes – os que foram enviados à Jerusalém desceram logo para Antioquia e, tendo reunido a comunidade, entregaram a epístola. “Quando a leram, sobremaneira se alegraram pelo conforto recebido” (At 15.31). Percebe-se que a igreja de Antioquia foi ricamente abençoada pela decisão daquele Concílio. E não podia ser diferente porque o que foi resolvido ali “pareceu bem ao Espírito Santo e a nós” (At 15.28). “O Espírito revelou o que os líderes da igreja deveriam dizer e fazer” [6].

Quando um concílio se submete verdadeiramente ao Espírito de Deus o resultado são decisões positivas e salutares para a vida da igreja. Mas quando o Espírito Santo (assim como a Bíblia) não passa de inocente útil para satisfazer a carnalidade humana, o resultado pode ser terrivelmente desastroso para a igreja.

Embora os sínodos e concílios não devam constituir regra de fé e prática, eles podem e devem ser usados como auxílio em uma (fé) e outra coisa (prática). Se as decisões deles forem pouco sábias, mas não se opõem diretamente à vontade de Deus, recomenda-se a submissão a elas por amor à paz. Mas se as decisões são contrárias à Palavra de Deus, então devemos rejeitá-las e sofrer as conseqüências [7].

IV O caráter eclesiástico dos sínodos e concílios

“Os sínodos e concílios não devem discutir nem determinar coisa alguma que não seja eclesiástica; não devem imiscuir-se nos negócios civis do Estado, a não ser por humilde petição em casos extraordinários, ou por conselhos, em satisfação de consciência, se o magistrado civil os convidar a fazê-lo”.

O caráter eclesiástico dos sínodos e concílios nunca deve ser perdido de vista. Por serem assembléias eclesiásticas, não estão sob a jurisdição dos sínodos e concílios assuntos meramente científicos, políticos, comerciais ou equivalentes. Não devem se envolver nos negócios civis do Estado, a não ser por humilde petição deste em casos extraordinários, quando toca diretamente nos interesses da igreja [8], ou por conselhos, em satisfação de consciência, se o magistrado civil os convidar a fazê-lo. Isso tudo é compreensível porque aos sínodos e concílios somente lhes correspondem assuntos como os de doutrina e moral, de governo da igreja e disciplina, e quaisquer outros que tenham a ver com a preservação da unidade e da boa ordem na igreja de Jesus Cristo. Mais particularmente, têm que ver com (a) assuntos que devido a sua natureza correspondam à jurisdição de assembléias menores, mas que por uma ou outra razão, ditas assembléias menores não podem resolver; e (b) assuntos que devido a sua natureza, correspondam à jurisdição de uma assembléia maior, visto que pertencem às igrejas em geral, tais como assuntos relacionados com a confissão, a ordem eclesiástica ou a liturgia da igreja.

Contudo, se por um lado os sínodos e concílios não devem tratar de assuntos que pertencem à jurisdição do magistrado civil, do outro eles devem ensinar aos membros das igrejas seus deveres com respeito ao poder civil, e do cumprimento desses deveres como obrigação religiosa (cf. Rm 13.1-7; 1Pe 2.11-17).

Notas
[1] Portanto, toda vez que aparecer a palavra “concílio” neste artigo entenda-se concílios em geral.
[2] Cf. J. H. Hall, Concílios eclesiásticos, p. 318.

[3] Cf. L. Berkhof, Manual, p. 261.

[4] Institución, IV,ix,2. Calvino está pensando principalmente nos concílios católico-romanos.

[5] Cf. Calvino, Institución, IV,ix,10,11.

[6] Kistemaker, Acts, p. 562.

[7] Cf. A. A. Hodge, Comentário, p. 350,51.

[8] Cf. A. A. Hodge, Comentário, p. 350.

Bibliografia

A Confissão de Fé de Westminster. 3a ed. São Paulo: Cultura Cristã, 1997.
BERKHOF, L. Manual de Doutrina Cristã. Campinas/Patrocínio: LPC/Ceibel, 1985.

___________ Teologia Sistemática. 2a ed. Grand Rapids: T.E.L.L., 1987.

CALVINO, J. Institución de la Religión Cristiana. Vol. II. Países Bajos: Felire, 1986.

HALL, J. H. Concílios Eclesiásticos. In: EHTIC. Vol. I. São Paulo: Vida Nova, 1988.

HODGE, A. A. Comentário de la Confesión de Fé de Westminster. Barcelona: CLIE, 1987.
KISTEMAKER, S. J. Exposition of the Acts of the Apostles. New Testament Commentary. Grand Rapids: Baker Book House, 1990.

WHEATON, D. H. Sínodo. In: EHTIC. Vol. III. São Paulo: Vida Nova, 1990.

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