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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

XXII - O VERBO

Parte XXII
O VERBO

Texto básico: João 1.1-3,14

Nos estudos formais de Lingüistica, Gramática e Estilística, aprendemos que a palavra é um "signo arbitrário e convencional". Aprendemos que a palavra transmite noção e imagem, imagem que nem sempre é bem determinada. Um exemplo é "manga". Se a pergunta for feita a qualquer pessoa, possivelmente três ou quatro significados serão dados. Pode ser "manga de paletó, casado, camisa ou blusa", ou a saborosa "fruta anacardiácea" que vem da Ilha de Itaparica. Os mais ligados à vida campestre, vida de fazenda, dirão que é a "passagem cercada onde se guarda o gado". Além desses três sentidos, há, pelo menos, mais onze, como "tromba-d'água", ou "peça tubular de vidro que protege a chama no candeeiro", ou, ainda flexão do mangar "mangar" (= "zombar"). 


Porque um signo e uma imagem, achamos graça quando descobrimos que em outra língua certa palavra semelhante a outra velha conhecida nossa quer dizer outra coisa:
¨ Push, em inglês é "empurrar, e não "puxar"como parece à primeira vista;
¨ Late (pronunciado leit') não é o rico alimento líquido e opaco dos filhotes dos mamíferos;
¨ "Estar embarazada" não é, em espanhol, estar a jovem numa situação de vexame ou vergonha, mas "estar grávida";
¨ "Comida esquisita", também na língua de Cervantes, é uma refeição "saborosa".


Um verbo:


¨ Indica uma ação, uma condição ou um processo ("correr", "sentir" e "amanhecer", respectivamente) respectivamente);
¨ Pode ser uma palavra ('fazer") ou uma frase ("deve ser feito"),

Mas ser uma pessoa? Esse é o nosso tema.


"NO PRINCÍPIO ERA O VERBO..." (V.1)


O chamado "Prólogo do Evangelho de João" representa um resumo poético de toda a teologia e de toda a narração evangélica. Mostra um grande ciclo, ou seja, o Filho de Deus, Jesus Cristo, desce do céu até o nível do ser humano, e sobe de volta ao céu levando o homem consigo até o nível divino. E, assim, com a vinda de Cristo, inaugura-se a longamente esperada nova criação tanto do universo (Rm 8.19-21) quanto da humanidade (2Co 5.17). Diz o texto escolhido que "No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Estes versículos, que relembram o início do Livro do Gênesis, mostram que a Palavra (o Verbo), no momento da criação, já existia, por não ser criada: era Deus.

Como a Igreja Primitiva soube colocar tão bem esse artigo de fé em forma de hino! Aqui temos um antigo hino dos nossos irmãos da Igreja Apostólica (como também Fp 2.6-11; Cl 1.15-20 e 1Tm 3.16). Pois, como em Israel antigo os atos salvadores de Deus eram cantados, e exemplos são os Salmos 78, 105, 106, também o Novo Israel resume a história sagrada, a história da salvação, em um hino.

Isso quer dizer que temos não apenas uma reflexão e afirmação teológicas, mas uma adoração, um ato de celebração em termos de ação de graças. E, deste modo, esse hino de louvor a Deus que ressalta Sua benignidade e salvação, retrocede ao passado, reflete o presente e aponta para a eternidade.

O Verbo de Deus... a Palavra de Deus... Jesus Cristo, a Comunicação de Deus. Sua vinda e Sua vida são interpretadas como o modo de Deus Se comunicar conosco.

Lógos (o vocábulo traduzido por Verbo ou Palavra) é uma das palavras mais ricas da história religiosa. Era bem entendida pelos judeus porque a palavra (davar em hebraico)era vista
¨ Como uma energia soberana que trazia as coisas à vida (cf. Gn 1.3,6,9,11,14,20,24,26; Sl 33.6,9);
¨ Também como algo que pode queimar como fogo ou quebrar como um martelo (Jr 23.29);
¨ Como algo que executava os planos de deus (Is 55.11);
¨ Como uma revelação da Sua vontade (Sl 119).

Para os gregos, a palavra (logos) é um princípio filosófico, e não uma força pessoal. É mais pensamento que palavra. Heráclito, filósofo, disse ser o logos o alicerce da ordem e da continuidade num mundo de fluxo e refluxo como a maré alta e a maré baixa. Os estóicos disseram que a mente de Deus dá ao universo a sua estabilidade, e Filo de Alexandria (judeu , por sinal) interpretou como a chave para o sentido e a razão da vida.

A Igreja apostólica, por sua vez, fazia da pregação um "ministério do Logos", um ministério do Verbo, um ministério da Palavra, e o conteúdo dessa mensagem era o próprio Cristo (Lc 1.2; At 1.21,22). Por esse motivo, Jesus é o Verbo da Vida (Ap 19.23), é a Palavra da Vida (1Jo 1.1,2).

Em resumo, o verbo, a Palavra de Deus, é um poder divino, um princípio racional e uma proclamação salvadora. O judeu entende, o grego entende e o cristão entende e proclama. A Versão Inglesa de Hoje (Today's English Veersion) assim traduz: "Desde o princípio, quando Deus era, o Verbo também era; onde deus Deus estava, o Verbo estava com ele; o que Deus era, o Verbo era também".

E daí as lições, não uma Teoria Geral da Comunicação, como em Watzlawski, mas uma Teologia da Comunicação Divina. O Verbo sempre foi uma realidade, pois "no princípio" da própria criação do mundo, das coisas, dos seres, o Verbo já era Deus.

Por natureza eterna, Deus Se comunica. Ou seja, os ídolos são mudos (1Rs 18.26-29; Sl 115.3-8; Hc 2.18,19; 1Co 12.2), mas Deus sempre teve uma palavra. Assim, nos profetas (Jr 4.3; 6.16; Ez 14.12; Os 4.1), e por fim em Jesus Cristo (Hb 1.1,2)


"O VERBO SE FEZ CARNE" (V.14)


O prólogo do Evangelho de João vai crescendo, crescendo como uma sinfonia sublime, maravilhosa, majestosa, e atinge seu clímax, transborda de significado, e como uma cachoeira irrompe no versículo 14. 

Toda a história do Verbo de Deus antes da encarnação fora apresentada: Sua essência, Sua eternidade, Sua divindade, Sua função criadora. E agora, diz o evangelista, "O Verbo se fez carne, e habitou entre nós. Vimos a sua glória, a glória como do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade", ou como já foi colocado, "O Verbo se tornou carne, armou sua tenda no nosso meio, e nos presenteou a plenitude da vida divina 
(vida eterna)".

O Verbo veio a fim de ser uma ponte, a fim de aproximar Deus dos seres humanos, e as pessoas de Deus. Em Jesus Cristo, Deus pronunciou Sua Palavra final e para todo o tempo e eternidade.

Sim; Jesus fez-Se ser humano, vestiu a nossa pele, tornou-Se como nós, em tudo menos em pecado (Fp 2.6,7; Hb 4.15). E daí as lições:
¨ O Verbo de Deus Se tornou ser humano para destruir as forças do mal (quando de Sua morte, Hb 2.14);
¨ O Verbo assumiu nossa natureza para que pudéssemos assumir a Sua natureza (Fp 2.7; Cl 2.9,10);
¨ O Verbo de Deus participou de nossa miséria, para que pudéssemos participar de Sua plenitude (Ef 1.23; 3.19);
¨ O verbo andou em nossas trevas para que pudéssemos andar em Sua luz (Jo 1.9; Cl 1.13);
¨ E experimentou nossa fraqueza, para que pudéssemos experimentar e participar da Sua vida, a vida em abundância (Rm 8.3; Hb 2.9)

Jesus como Verbo de Deus é o poder de Deus, a sabedoria de Deus, o evangelho de Deus (1Co 1.23,24). O Verbo se fez carne para a salvação do que crê (1Tm 1.15; Jo 3.17; Lc 19.10; Gl 4.5). A encarnação do Verbo é sinal do imenso amor de Deus por nós (1Jo 4.9,10,19; Rm 5.6).

Por todas essas razões, temos em João 1.1,2, e, sobretudo, no verso 14, o ponto essencial sobre a unidade da criação, da revelação e da redenção em Cristo. Aquele que cria pela Palavra também Se revela e salva pela mesma Palavra.

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