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quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

XVIII - O ESPÍRITO SANTO NO PROCESSO HERMENÊUTICO

Parte XVIII
O ESPÍRITO SANTO NO PROCESSO HERMENÊUTICO


Introdução




O presente trabalho é uma análise sucinta do papel do Espírito Santo no processo hermenêutico e de sua relação com os outros elementos do chamado círculo hermenêutico. Nós o dividimos em três capítulos principais, sendo que somente o último deles trata diretamente do Espírito Santo no processo hermenêutico. Acreditamos que esta disposição será necessária porque os dois primeiros capítulos servirão de pano de fundo ao tema. Sendo assim, procuramos definir a hermenêutica e seu propósito, a relação entre o Espírito Santo, a Bíblia e o intérprete e, por último, o papel do Espírito Santo na ciência hermenêutica e no círculo hermenêutico.



Quanto ao Espírito Santo no círculo hermenêutico, propriamente dito, abordamos a questão no conceito de missão integral numa teologia de contexto. Como se relaciona o Espírito com os quatro elementos do círculo hermenêutico? O Espírito deveria ou não ser representado graficamente com os outros elementos do círculo? Como definir o Espírito Santo no círculo hermenêutico? Esperamos responder a contento a estas e outras perguntas semelhantes. Nossa pesquisa não é exaustiva mas espero que atenda o propósito para o qual foi escrita; a saber, valorizar a importância e centralidade do Espírito Santo no processo hermenêutico.
"No estudo da Bíblia, não é bastante que entendamos o sentido de autores secundários (Moisés, Isaías, Paulo, João); temos que entender a mente do Espírito" (Louis Berkhof).



I. Definição e Propósito da Hermenêutica

1.1. Definição de Hermenêutica

"Hermenêutica" é uma palavra de origem grega. Platão (c. 427-347 a.C.) foi o primeiro a utilizá-la como termo técnico.

No sentido amplo do termo, a hermenêutica pode ser definida como a ciência que nos ensina os princípios, as leis e os métodos de interpretação de qualquer produção literária. Antônio Almeida diz que hermenêutica é "a ciência e a arte de interpretar. É ciência porque postula princípios seguros e imutáveis; é arte porque estabelece regras práticas".1 Especificamente falando, a hermenêutica sacra tem caráter muito especial, porque trata de um livro peculiar no campo da literatura - a Bíblia como inspirada Palavra de Deus. E somente quando reconhecemos o princípio ativo da pessoa do Espírito Santo na inspiração da Bíblia e por Ele somos guiados na
compreensão da mesma, é que podemos conservar o caráter doutrinário e prático da hermenêutica bíblica.




1.2. O Propósito da Hermenêutica



Em geral, estuda-se hermenêutica com o propósito de interpretar produções literárias do passado. Sua tarefa principal é indicar o meio pelo qual possam ser removidas as diferenças ou distâncias entre um autor e seus leitores. A hermenêutica nos ensina que isso só se realiza satisfatoriamente quando os leitores se transpõem ao tempo e ao espírito do autor para, por exemplo, analisar as características pessoais do autor, as circunstâncias sociais do mesmo e as circunstâncias peculiares aos escritos.
Na hermenêutica sacra o ponto de partida é a própria Bíblia, uma vez que ela mesma é o objeto de pesquisa da hermenêutica. O propósito da hermenêutica sacra é "transportar a mensagem bíblica, a partir do seu contexto original, a uma situação histórica contemporânea".2

Infelizmente, boa parte dos estudiosos bíblicos partem da metodologia para a Bíblia. Primeiro formulam suas conclusões pessoais e depois vão aplicá-las à interpretação das Escrituras, ao invés de deixarem que a Bíblia formule as regras para sua própria interpretação. Valdir Steurnagel, por exemplo, entende que "nós podemos ter as duas coisas. Teologia de baixo e teologia de cima".3 Entretanto, Padilla observa corretamente: "O esforço para deixar que as Escrituras falem, sem impor-lhes uma interpretação elaborada de antemão, é uma tarefa hermenêutica obrigatória de todo intérprete, seja qual for sua cultura."4

Um dos princípios defendidos pelos reformadores do século XVI era que a Scriptura Scripturae interpres. Um século depois da Reforma Protestante, este princípio foi apreciado e elaborado pela Assembléia de Westminster do seguinte modo:
A regra infalível de interpretação da Escritura é a mesma Escritura; portanto, quando houver questão sobre o verdadeiro e pleno sentido de qualquer texto da Escritura (sentido que não é múltiplo, mas único), esse texto pode ser estudado e compreendido por outros textos que falem mais claramente5

Na verdade é quase que impossível nos aproximarmos da Bíblia sem pressuposições variadas, herança herdada de diversas influências (sociais, culturais, teológicas, etc.). Os reformadores, por exemplo, não foram os primeiros e nem seriam os últimos a negarem, entre eles mesmos, o princípio de que a Escritura interpreta a si mesma. Dentre outras coisas, temos o exemplo clássico dos conceitos teológicos de Lutero, Zuínglio e Calvino em relação à Ceia do Senhor. Contudo, todas as pressuposições, sejam as nossas ou sejam as deles, não são e nem podem ser justificadas pela Bíblia. Afim de que as Escrituras possam ser estudadas com o mínimo de coerência, é preciso interpretá-las gramática, histórica e teologicamente de mente e coração abertos para ouvirmos com humildade e disposição a voz do Espírito Santo de Deus.




II. O ESPÍRITO SANTO, A BÍBLIA E O INTÉRPRETE

2.1. O Espírito Santo e a Bíblia

"Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, afim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra" (2 Tm 3.16,17).


"Sabendo, primeiramente, isto, que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação; porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana, entretanto homens [santos] falaram da parte de Deus movidos pelo Espírito Santo" (2 Pe 1.20,21).

As passagens bíblicas que transcrevemos acima, assim como tantas outras que poderiam ser acrescentadas a elas, mostram que a Bíblia tem um autor principal. "Ela é, em todas as suas partes, produção do Espírito Santo".6

Durante a história da Igreja, surgiram conceitos diversos quanto a relação existente entre o Espírito Santo e a Bíblia. Os pelagianos e racionalistas sustentavam que a operação intelectual e moral da Bíblia era suficiente para produzir a salvação, independentemente do Espírito Santo. Os antinomianos, por outro lado, ensinavam que o Espírito Santo fazia tudo, independente da Palavra de Deus. A igreja evangélica, por sua vez, sempre sustentou o seguinte: A Bíblia sozinha não é suficiente para salvar, e embora o Espírito Santo possa, geralmente Ele não atua sem ela. Isto não significa que o Espírito seja subserviente à Palavra de Deus, mas sim, que a soberania divina estabeleceu a livre atuação do Espírito mediante a Palavra. "Na aplicação da obra da redenção os dois trabalham juntos, o Espírito usando a Palavra como Seu instrumento. A prédica da Palavra não produz o fruto desejado até que se torne eficaz pelo Espírito Santo".7 A verdade é que o Espírito Santo honra a Bíblia, fala pela Bíblia e é reconhecido pela Sua harmonia com ela. Por isso, os reformadores frequentemente se referiam às Escrituras como "a imagem do Espírito".




2.2. O Espírito Santo e o Intérprete



Desde os tempos bíblicos Deus levantou profetas e intérpretes da lei que conduzissem Seu povo segundo os princípios estabelecidos em Sua Palavra. No capítulo 8 do livro de Neemias vemos vários servos de Deus que juntamente com os levitas "ensinavam o povo na lei" (v7). E mais: "Leram no Livro, na lei de Deus, claramente, dando explicações, de maneira que entendessem o que se lia" (v8). No capítulo 8 de Atos nos deparamos com a clássica passagem de Filipe e o eunuco. O alto oficial de Candace, rainha dos etíopes, estava lendo o livro do profeta Isaías. Até certo ponto podemos admitir que ele entendia o que estava lendo. Compreendia que o profeta falava de grandes padecimentos e extrema humilhação que um servo do Senhor teria sofrido ou iria sofrer. Faltava-lhe, no entanto, entender o essencial para a clareza da profecia: a respeito de que servo o profeta se referia. Falava de si mesmo ou de algum outro? "Então Filipe explicou; e, começando por esta passagem da Escritura, anunciou-lhe Jesus" (v35). E não poderíamos nos esquecer do Senhor Jesus, quando no caminho de Emaús diz a dois de seus discípulos: "Porventura não convinha que o Cristo padecesse e entrasse na sua glória? E, começando por Moisés, discorrendo por todos os profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava em todas as Escrituras" (Lc 24.26,27).
Mas a atuação do Espírito, em capacitar os intérpretes da Bíblia, não se limitou a eles.

Deus tem levantado nos dias de hoje homens e mulheres, verdadeiros mestres da exposição bíblica, para orientarem a Sua Igreja. As divergências teológicas e de interpretação sempre serão evidentes entre eles, até porque iluminação não é inspiração, no sentido bíblico daquela "influência sobrenatural exercida pelo Espírito Santo sobre os escritores sacros, em virtude da qual seus escritos conseguem veracidade divina, e constituem suficiente e infalível regra de fé e prática".8 Mas o direito da interpretação não se restringe aos chamados "doutores". O mesmo Espírito capacita os mais simples para compreenderem o sentido das Escrituras com muita propriedade e coerência. Particularmente tenho sido enriquecido em meu ministério pastoral por irmãos e irmãs que, não tendo formação teológica alguma mas conhecendo muito bem o seu Deus, lançam luz sobre passagens bíblicas como eu nunca havia pensado antes. E muitos desses irmãos e irmãs são originais em seus conceitos. Entretanto, não quero dizer com isso que o alvo da boa interpretação seja a originalidade e nem também que um texto não possa parecer totalmente novo para quem o ouve ou o lê pela primeira vez. O alvo da boa interpretação é, segundo os doutores Gordon D. Fee e Douglas Stuart, chegar ao "sentido claro do texto".9 Para isso, é necessário os auxílios internos da própria Bíblia para interpretarmos corretamente o pensamento de Deus mediante os autores secundários e dos auxílios externos disponíveis para a interpretação gramatical do texto bíblico, tais como: gramática, dicionários, concordâncias, léxicos, analíticos e comentários. É preciso que os comentários ocupem, quando muito, o último lugar em nossas pesquisas, visto que um comentário é sempre uma opinião e não a última palavra de quem quer que seja.



III. O ESPÍRITO SANTO NO PROCESSO HERMENÊUTICO

3.1. O Espírito Santo e a Ciência Hermenêutica



Certamente o Espírito Santo pode atuar independente de meios, como já mencionamos. Entretanto, o Espírito age, geralmente, com e através da Palavra de Deus. E de que modo Ele o faz? De um lado, através da iluminação do entendimento do intérprete; de outro, na condução do uso correto das ferramentas hermenêuticas por parte do intérprete. O Espírito Santo não milita contra qualquer instrumento que nos ajude a compreender o sentido das Escrituras; pelo contrário, como acabamos de afirmar, Ele mesmo se utiliza da hermenêutica para nos auxiliar no modo correto de interpretar a Bíblia. A própria Bíblia apresenta muitos exemplos dessa natureza. Em muitos casos, os autores investigaram de antemão a matéria a respeito da qual pretendiam escrever. Lucas nos diz no prefácio do seu Evangelho que procedeu deste modo; e os autores dos livros dos Reis e Crônicas se referem constantemente às suas fontes. Além disso, os autores do Novo Testamento em várias ocasiões interpretaram as profecias do Antigo Testamento como se cumprindo em ocasiões específicas. Como chegavam a essas conclusões? Naturalmente com os recursos da hermenêutica. O apóstolo Pedro criticou aqueles que, por falta de uma hermenêutica sadia, deturpavam os ensinamentos de Paulo e das demais Escrituras "para a própria perdição deles" (2 Pe 3.15,16).

Com certeza, nos tempos bíblicos os escritores e profetas sagrados não conheciam a hermenêutica como nós a conhecemos hoje, isto é, como ciência e arte de interpretação da Bíblia, mas nem por isso eram menos favorecidos, até porque eles possuíam a inspiração do Espírito Santo que os habilitava a escrever e interpretar a Escritura Sagrada sem nenhuma margem de erro. Isto não quer dizer que estivessem livres do fracasso de entender a própria mensagem. O fato de os profetas algumas vezes fracassarem em entender a mensagem que eles mesmos traziam ao povo, serve também para demonstrar que aquela mensagem vinha de fora, de Deus, e que, portanto, não partia da vontade pessoal deles. Daniel, por exemplo, certa vez teve uma visão e logo em seguida declarou que não entendia o significado daquilo tudo (Dn 12.8,9). Zacarias, por sua vez, teve várias visões com mensagens para o povo, mas precisou que um anjo o auxiliasse na interpretação delas (Zc 1.9; 2.3; 4.4). Pedro nos informa que os profetas que apresentavam a mensagem a respeito dos sofrimentos e glórias de Cristo, com frequência investigaram os detalhes disso, para poder entender com mais clareza (I Pe 1.10,11).

Não devemos nos esquecer que o ato de fazer lembrar e entender a vontade de Deus para a nossa vida é atribuição do Espírito Santo. Como vimos, Ele atuou no passado na mente e no coração de homens e mulheres de Deus e hoje o faz iluminando nosso entendimento para entendermos o que a Bíblia diz, com suas aplicações práticas para a vida diária. E mesmo que em certas ocasiões o Espírito nos faça compreender o sentido das Escrituras independente de uma pesquisa prévia, via de regra as coisas não funcionam desse modo, até porque, normalmente, o Espírito de Deus nos orienta através dos recursos da hermenêutica. Além disso, a uma pesquisa diligente no intuito de se entender o que lemos, deve-se unir a oração como expressão de uma vida dependente do Espírito10. E assim, como dizia Lutero, oremos como se tudo dependesse de Deus e trabalhemos como se tudo dependesse de nós mesmos.




3.2. O Espírito Santo e o Círculo Hermenêutico



1. O Círculo Hermenêutico



Esta última parte do nosso trabalho (O Espírito Santo e o Círculo Hermenêutico) é o resultado natural de tudo que vimos até aqui. É a aplicação prática do Espírito Santo no processo hermenêutico dentro do chamado círculo hermenêutico. O que é o círculo hermenêutico? Como poderíamos representá-lo e defini-lo?

Graficamente podemos representar o círculo hermenêutico desse modo:

Embora os estudiosos não neguem a importância do Espírito Santo no círculo hermenêutico, poucos enfatizam a centralidade Dele. René Padilla, por exemplo, diz que "a iluminação do Espírito é indispensável no processo interpretativo"11 e que é "urgente a necessidade de uma leitura do Evangelho desde cada situação histórica particular, debaixo da direção do Espírito Santo".12 Entretanto, quando Padilla representa graficamente o círculo hermenêutico omite a pessoa do Espírito. Esta omissão também é evidente no artigo de Daniel S. Schipani (Crezcamos en todo ... en Cristo em Misión en el Camino, p. 127).13Um dos ensaios, dentre os que encontrei, que abordam com mais ênfase a pessoa do Espírito Santo no círculo hermenêutico é The Role of the Holy Spirit in the Hermeneutic Process: The Relatioship of the Spirit's Ilumination to Biblical Interpretation do Dr. Fred H. Klooster em Hermeneutcs, Inerrancy and the Bible, pp. 451-472.
Nosso objetivo neste capítulo é tentar apresentar , de maneira prática, o relacionamento do Espírito Santo no círculo hermenêutico, visto que Padilla e Schipani não dizem quase nada sobre o Espírito e Klooster, apesar de falar muito sobre o Espírito Santo no processo hermenêutico, não vai além do campo teórico e da teologia. E agora, uma vez que o Espírito Santo está no círculo, ligado aos quatro elementos hermenêuticos e vice-versa, podemos definir o círculo hermenêutico como a interligação mútua e dinâmica na perspectiva que devemos ter (como intérpretes que devemos ser) da Bíblia e da realidade histórica sob a ótica e direção do Espírito Santo de Deus. Em outras palavras, a perspectiva que se tem de um elemento do círculo hermenêutico afeta a perspectiva que se tem do outro. A compreensão da Bíblia, a compreensão do contexto histórico e a compreensão do Espírito Santo, na perspectiva do intérprete, devem estar integradas mutuamente e não podem ser separadas. A interpretação de um incide na interpretação do outro, até porque neste caso o fator diálogo passa a ser, de certa forma, o segredo do sucesso do círculo hermenêutico. O círculo hermenêutico segue, então, uma dupla direção, em que não somente o intérprete e o texto (como sugere Padilla, op. cit., p. 08), mas todas as partes dele estão em constante diálogo.
Como o Espírito Santo se relaciona com os quatro elementos do círculo hermenêutico? Façamos, então, uma breve análise do papel do Espírito Santo na dinâmica do círculo hermenêutico, a fim de entendermos com mais clareza o significado desse processo.

2. O Espírito Santo no Círculo Hermenêutico

Por uma questão de didática e propósito achamos por bem abordar, já no capítulo anterior desse trabalho, a relação do Espírito Santo com a Bíblia e o intérprete numa perspectiva mais teológica. Agora, passaremos a tratar, não somente destes ( Bíblia e intérprete), mas de todos os elementos do círculo hermenêutico numa perspectiva de missão integral, como acreditamos ser o principal objetivo do Espírito Santo no processo hermenêutico.


a. O Espírito Santo e a situação histórica do intérprete



Não se pode negar de forma alguma que todo intérprete, quer seja da Bíblia, quer seja da vida de um modo geral, é fruto de sua época, influenciado por todos os fatores e ditames do seu tempo. No que se refere à Bíblia, em especial, milhares de anos e circunstâncias culturais separam o intérprete das Escrituras Sagradas. O Espírito Santo sabe e compreende estas diferenças. Dá ao intérprete a liberdade de se aproximar da Palavra de Deus com todos os seus pressupostos, embora não lhe dê o direito de fazer com que a Bíblia diga o que ele gostaria que ela dissesse. Repitamos novamente as já citadas palavras de René Padilla: "O esforço para deixar que as Escrituras falem, sem impor-lhes uma interpretação elaborada de antemão, é uma tarefa hermenêutica obrigatória de todo intérprete, seja qual for sua cultura".14 A Bíblia é a voz do Espírito ao povo de Deus. E somente direcionado pelo Espírito, mediante a Palavra, é que o interprete se tornará profeta e portador fiel da mensagem do Espírito Santo de Deus.



b. O Espírito Santo e a cosmovisão do intérprete



Nada melhor do que o próprio intérprete para interpretar a realidade em que vive. Na perspectiva de sua cosmovisão ele pode aplicar os princípios bíblicos à realidade que vê e sente, pois a sua missão não é formular meras doutrinações, mas extrair da Bíblia as aplicações e implicações práticas da sã doutrina para seu povo. A menos que se prejudique o significado original das Escrituras, a cosmovisão do intérprete é válida e sustentada pelo Espírito Santo. A Bíblia não seria o que é, como Palavra de Deus, se não fosse aplicável em todas as épocas por quem vive a vida no seu próprio contexto. "O propósito do processo interpretativo é a transformação do povo de Deus em sua situação concreta".15




c. O Espírito Santo e a Bíblia



O Espírito Santo é o mediador do diálogo entre as Escrituras e o contexto histórico contemporâneo. A Bíblia fala hoje porque é a voz do Espírito de Deus. O Deus que falou no passado continua falando hoje em dia a toda a humanidade, através das Escrituras. A mensagem bíblica de transformação do indivíduo e da sociedade, mediante a vocação de homens e mulheres para proclamarem o evangelho de Jesus Cristo aos homens e mulheres do nosso tempo, é a dinâmica do Espírito Santo.




d. O Espírito Santo e a Teologia

O Espírito Santo é a fonte de toda teologia bíblica sadia. E para que uma teologia seja verdadeiramente bíblica, e expresse a mente do Espírito, precisa ser,

necessariamente, uma teologia de contexto, como costumava enfatizar Orlando Costas em seus livros e artigos16. A teologia deve ser o resultado de uma interpretação fiel da Bíblia, pois só assim tocaremos o coração do povo. E esse deve ser o nosso maior objetivo: fazer uma teologia que toque o coração do povo. Uma teologia que atenda os anseios e necessidades do indivíduo e da sociedade. Uma teologia que nos faça compreender que o Deus transcendente também é o Deus imanente que tem cuidado de nós, em todos os níveis imagináveis.

NOTAS

1. A. Almeida, Manual de Hermenêutica Sagrada, p. 11.


2. R. Padilla, A Palavra Interpretada: Reflexões Sobre Hermenêutica Contextualizada, p. 5.

3. Anotações não publicadas.





4. R. Padilla, Op. Cit., p. 06. 








5. A Cofissão de Fé de Westminster, I, 9.

6. L. Berkhof, Princípios de Interpretação Bíblica, p. 56.

7. L. Berkhof, Manual de Doutrina Cristã, p. 276.





8. L. Berkhof, op. cit., p. 44.






9. G.D.Fee & D.Stuart, Entendes O Que Lês?, p. 14.

10. Para uma discussão interessante sobre o Espírito Santo, a interpretação bíblica e a espiritualidade do crente, veja Moisés Silva, A Função do Espírito Santo na Interpretação Bíblica em Fides Reformata, Vol. II, Nº 2, pp. 89-96.






11. R. Padilla, Op. Cit., p. 05.






12. Idem, p. 09.


13. Schipani, sem nos dar uma justificativa plausível, usa a expressão circulação hermenêutica no lugar de círculo hermenêutico. Ele apenas diz: "O conceito de 'circulação hermenêutica' (em lugar de 'círculo hermenêutico' como é utilizado por Rudolf Bultmann e Juan Luis Segundo, entre outros) é proposto por Georges Casalis em Las buenas ideas caen del cielo, DEI, San José, 1977". Nota 18, p. 126. 






14. R. Padilla, Op. Cit., p. 06.


15. Idem, p. 07.

16. Veja, por exemplo, Compromiso y Misión de Orlando Costas, Editorial Caribe, 1979 e Misión en el Camino: Ensayos em homenaje a Orlando E. Costas, vários autores, Fraternidade Teológica Latinoamericana, 1992.





BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, A; Manual de Hermenêutica Sagrada, 2ª Edição, CEP, SP, 1985.


BERKHOF, L.; Manual de Doutrina Cristã, LPC, SP, 1986.

___________; Princípios de Interpretação Bíblica, 3ª Edição, Juerp, RJ, 1985.





COOK, G. & Outros; Misión en el Camino: Ensayos en Homenaje a Orlando E. Costas, Fraternidade Teológica Latinoamericana, Argentina, 1992.

COSTAS, O.E.; Compromiso y Misión, Editorial Caribe, Costa Rica, 1979.






FEE G.D. & Stuart D.; Entendes O Que Lês?, Vida Nova, SP, 1984.

MARRA, C.A.B. (ed.); A Confissão de Fé de Westminster, 3ª Edição, Cultura Cristã, SP, 1997.


MATOS, A.S., Lopes, A.N. (eds); Fides Reformata, Publicação do Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição, SP, Vol. II, Nº 2, 1997.

PADILLA, C.R.; A Palavra Interpretada: Reflexões Sobre Hermenêutica Contextualizada, ABUB, Curso de Obreiros, 1980.

_____________; El Círculo Hermenêutico, Artigo não publicado.





RADEMACHER, E.D. & Preus, R.D. (eds.); Hermeneutcs, Inerrancy and the Bible, Zondervan, Grand Rapids, 1984.
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