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terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

XI - ESPIRITUALIDADE MISSIONÁRIA

Parte XI
ESPIRITUALIDADE MISSIONÁRIA
INTRODUÇÃO
Desejo com este trabalho mostrar ao leitor, como está a espiritualidade da igreja dos nossos dias, analisando-a por uma perspectiva missiológica.



A espiritualidade é a comunhão que se tem com Deus e com o próximo, e se caracteriza pela prática do amor, e infelizmente esta comunhão está desgastada, e é superficial em muitas igrejas contemporâneas.

A igreja precisa de um fundamento sólido para uma espiritualidade verdadeira, aquela que se manifesta na prática, e para isso a igreja precisa conhecer o período histórico em que vive, a fim de que essa prática seja eficaz.


I - A CRISE DE ESPIRITUALIDADE DA IGREJA CONTEMPORÂNEA


"Portanto, ide e fazei discípulos de todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho mandado..."
Mt 28:19-20.

Esta é a Grande Comissão, em que Jesus ordena que sejamos missionários, ordena que a igreja seja missionária, por que se não for assim a igreja estará fora dos planos de Deus. Podemos identificar se uma igreja tem uma espiritualidade verdadeira ao olhar para sua posição em relação as missões.

Hoje, muitas igrejas são frias, vivem sem amor, vivem um evangelho estático, estão afastadas dos planos de Deus, como diz o Pr. Valdir França: " Estão com miopia missionária"(1), ou seja, não enxergam a necessidade do mundo de receber o evangelho, enxergam somente suas próprias necessidades, seus problemas, seus sonhos, são egoístas, não amam as almas perdidas, estão em crise, vivem sem uma espiritualidade integralizadora e missionária.

Esta crise de espiritualidade missionária está intimamente ligada a outras duas crises que também existem na igreja contemporânea: 

A crise teológica: Muitas pessoas não conhecem verdadeiramente o seu Deus, cantam e adoram um deus criado por suas mentes, desconhecem o caráter missionário do verdadeiro Deus, não entendem o Calvário como palco da maior missão da história, a chamada MISSIO DEI. Falta, em muitas pessoas a fome e o amor à Palavra de Deus. A igreja carece de teologia, em especial, de uma teologia missionária.

A crise de identidade: Muitos cristãos não sabem por que são cristãos, ou seja, forram remidos por Cristo, selados pelo Espírito Santo, vivem dentro da igreja, porém não sabem o que fazer enquanto filhos de Deus. Se perguntarmos aos cristãos o porque que Deus os salvou, a maioria responderia que foi por causa de Seu amor, sem dúvida, isto está correto, entretanto existe outra razão, a vontade de Deus de nos tornar arautos do Rei, Cristo nos salva para que sejamos Sua testemunha, como está escrito "... a fim de anunciardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para sua maravilhosa luz". (I Pe 2:9) A igreja precisa ter consciência de sua identidade missionária.

Portanto, essa falta de espiritualidade missionária, teologia missionária e identidade missionária tem transformado em "guetos", onde as pessoas se dizem salvas, mas estão perdidas dentro de sua própria salvação pois não estão no mundo nem dentro dos planos de Deus. 


II - FUNDAMENTOS BÍBLICOS PARA UMA ESPIRITUALIDADE MISSIONÁRIA


David Livingstone disse: "Deus tinha um único Filho, e fez dele um missionário". 

Muitos versículos e exemplos bíblicos poderiam ser mostrados para fundamentar uma espiritualidade missionária, entretanto não há melhor fundamento bíblico para demonstrar a missão como fruto de uma verdadeira espiritualidade, do que Jesus Cristo.

O homem mais espiritual que já existiu, revelou para o mundo o que é uma espiritualidade missionária.

Seu ministério, Sua vida, Sua morte, Sua ressurreição, tudo aconteceu por causa de missões, tudo para revelar seu amor e perdão aos homens perdidos, portanto não existe espiritualidade sem ação missionária.

Buscar espiritualidade é buscar Jesus, é seguir Jesus, é ser igual a Jesus, e isso é impossível se não nos comprometermos com o Seu chamado missionário.

Por toda a Bíblia, Deus revela Seu caráter missionário, desde Gênesis quando Deus vai atrás e chama o homem caído até Apocalipse quando a missão chega ao seu fim, mas é em Jesus o ápice da missão de Deus, e o próprio Jesus é quem nos chama para uma verdadeira espiritualidade e para sermos Suas testemunhas (At 1:8; Mt 28:18-20; Jo 20:21, 17:18; I Pe 2:9) e enfrentar todos os obstáculos que possam aparecer e principalmente o maior deles: o "Calvário".

Se quisermos ter uma espiritualidade verdadeira temos que passar pelo Calvário, devemos seguir Jesus em Seu esvaziamento (Fp 2:6-8), devemos cumprir Sua ordem de "negar a si mesmo" e deixar pregado e morto na cruz o nosso "eu", para que gozemos da vida e da espiritualidade de Cristo em nós, então o amor de Deus revelado na cruz encherá nossos corações e seremos impulsionados pelo Espírito Santo para proclamar o evangelho, pois é ele o agente principal da missão.

Portanto, muitos cristãos precisam voltar para a Bíblia para conhecer a Deus, Sua obra, Seu caráter, precisam voltar a Jesus para saber o que é a espiritualidade, precisam saber que suas funções enquanto igreja, é anunciar o evangelho, muitos precisam passar pelo Calvário para saber o que é uma espiritualidade missionária.

Valdir Steuernagel define muito bem a espiritualidade:

"Uma espiritualidade sadia vive na presença de Deus, alimenta-se da Palavra, se expressa em comunidade e se caracteriza por um espírito missionário"(2).


III - ESPIRITUALIDADE PRÁTICA NA PERSPECTIVA MISSIOLÓGICA


Como já foi dito, Jesus é o pilar principal para uma espiritualidade genuína, portanto para vivermos em nosso tempo essa espiritualidade, devemos imitar Sua maneira de viver.

Jesus viveu uma espiritualidade integralizadora, de ações concretas. A espiritualidade de Cristo não era apenas celestial, mas também terrena, não apenas de oração, mas também de ação, não apenas de se encher do Espírito, mas também de compartilhar dessa plenitude, não era uma espiritualidade isolada, no monte, mas comunitária, com pessoas pecadoras. A espiritualidade de Jesus tinha um aspecto vertical, cujo alvo era Deus, e tinha um aspecto horizontal, cujo alvo era o ser humano.

É muito fácil falar sobre o evangelho, falar sobre missões, falar que somos espirituais por que conhecemos um pouco da Bíblia, vivemos na igreja, porém é difícil viver "nas nuvens", mas agindo constantemente, pois, espiritualidade é trabalho árduo para a expansão do reino de Deus.

O Rev. Júlio Paulo Tavares Zabatiero explica bem em um artigo como isso se sucede:

"Ser espiritual é algo que acontece no dia-a-dia, à medida em que entregamos toda nossa vida, nossos talentos e bens à missão do Reino de Deus" (3).

Espiritualidade prática não é experiências como cair no chão, dar 'gargalhadas no Espírito' ou momentos de choro, também não é sinais sobrenaturais como falar em línguas, profetizar ou ter visões, mas como diz o Rev. Júlio Zabatiero no mesmo artigo citado anteriormente, é o "compromisso diário e constante com a proclamação e a manifestação prática do reino de Deus" (4).

Devemos vencer todos os preconceitos se quisermos proclamar a manifestar este Reino, devemos vencer preconceitos culturais, geográficos, religiosos, políticos e econômicos para a realização da obra que Cristo confiou a nós a Sua igreja.

A prática da verdadeira espiritualidade missionária se faz presente em todas as classes da sociedade, em todos os tipos de sociedade, ou seja, atua no mundo todo. John Wesley entendeu isso quando disse: "Minha paróquia é o mundo" e também "Não creio em cristianismo sem conversão. E eu não creio em conversão sem compromisso social". 

Atuar na sociedade como cidadão, também é tarefa dos filhos de Deus, ou seja, fazer missões não é somente ir falar da salvação mas também fazer obras sociais e procurar fazer diferença no mundo em que vivemos.

Ademais, para que a prática de espiritualidade seja efetiva é preciso uma espiritualidade coletiva, ou seja, expressa em comunidade, em que toda a igreja esteja orando pelos países, missionários e organizações missionárias, e também contribuindo para o sustento dessas missões., pois hoje um dos maiores, se não o maior, problema para a propagação do evangelho é a falta de recursos financeiros. E é evidente que cada cristão deve testemunhar todos os dias o evangelho de Cristo, pois isso é fruto da verdadeira espiritualidade.


IV - ESPIRITUALIDADE MISSIONÁRIA E PÓS-MODERNIDADE


Embora Jesus seja a grande razão da nossa vida e o grande fundamento para uma espiritualidade missionária, vivemos em um tempo em que a Bíblia, a fé, a igreja e o próprio Jesus perderam seus significados, um tempo em que não existem mais paradigmas a serem seguidos, o hedonismo é exaltado e tudo o que é objetivo, absoluto, irrefutável, tradicional se tornou relativo, esse é o período denominado pós-Modernidade.

Como está , neste período a espiritualidade das pessoas?

Ricardo Gondim fala sobre isso: "A pós-modernidade esvaziou a religião formal, mas não conseguiu matar a sede de espiritualidade das pessoas"(5) as pessoas continuam sedentas, pois como para elas a existência de Deus é relativa, não há um alvo de busca, e portanto a sede espiritual permanece, por isso esse período é marcado fortemente pela crise existencial e espiritual da maioria das pessoas.

Como a missão e a espiritualidade da igreja tem sido afetada com a pós-modernidade?

Ricardo Gondim também descreve de forma clara e objetiva como está a espiritualidade da igreja de hoje. Ele diz:

"A espiritualidade dos dias de hoje é narcisista. As pessoas querem o melhor para si e buscam a Deus para crescer e progredir, não para glorificá-Lo. É uma espiritualidade que não desemboca em MISSÃO, mas se contenta com a experiência em si"(6)

É exatamente isso que está acontecendo, o evangelho que é pregado hoje é antropocêntrico, o que é valorizado são as experiências e não a vivência, enquanto a visão da necessidade do mundo em conhecer a Cristo fica encoberta pelo egoísmo dos próprios crentes, muitas pessoas, espalhadas por todo o mundo continuavam morrendo sem conhecer Jesus por que a "seara é grande mas os trabalhadores são poucos" (Mt 9:37)

Na pós-modernidade o evangelho passou a ser um produto e não o "poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê" (Rm 1:16), a graça já não é mais graça, ela é barganhada, a missão perdeu seu caráter de serviço, os crentes, as igrejas não são apaixonadas por missões, existe uma concorrência das denominações para conquistar adeptos de sua doutrina, os templos, a liturgia dos cultos, o louvor e a pregação estão deixando de ter a finalidade de agradar a Deus, para agradar a homens. Hoje, muitas igrejas não vêem o mundo como um campo missionário, mas como um campo de mercado. A missão deixou de ser missão, para ser "business".

Os cristãos não podem deixar que as influências pós-modernas tornem a missão uma busca por adeptos de um produto chamado evangelho cristão.

Portanto, a Igreja precisa voltar para a sã doutrina, precisa voltar para o verdadeiro Jesus, Ricardo Gondim disse: "Para resgatar a espiritualidade da igreja na pós-modernidade, urge que se restabeleça o espírito do Kerygma cristão"(7). A Igreja de Cristo precisa voltar a conhecer e proclamar o verdadeiro evangelho para um mundo tão confuso e sem Deus.


CONCLUSÃO


É um desafio viver uma espiritualidade verdadeira, aquela que é o combustível que impulsiona, mediante o Espírito Santo, todo cristão para a obra missionária.

Somente possuindo Jesus como referencial e fundamento é que as influências pós-modernas não irão destruir ou deturpar nossa espiritualidade, cuja finalidade deve ser glorificar a Deus através da prática das boas obras e da proclamação do Reino de Deus.

Que Deus ajude Seu povo a viver de fato, uma espiritualidade missionária!


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

FIORES, Stefano & GOFFI, Tullo (Orgs); DICIONÁRIO DE ESPIRITUALIDADE, São Paulo: Paulus, 1.993 
GALILEA, Segundo; O CAMINHO DA ESPIRITUALIDADE, São Paulo: Paulinas, 1.985
GONDIM, Ricardo; FIM DO MILÊNIO: Perigos e desafios da pós-modernidade na igreja, São Paulo: Abba Press, 1.997
LIMA, Éber Ferreira Silveira (Org.); PAIXÃO MISSIONÁRIA, Londrina: SMI - IPIB, 1a ed. 1.994
STEUERNAGEL, Valdir; OBEDIÊNCIA MISSIONÁRIA E PRÁTICA HISTÓRICA, São Paulo: ABU, 1.997

NOTAS

(1) França, Valdir. Missões: Uma Tarefa para Todos. Londrina, Ed. Monorah, 1996
(2) STEUERNAGEL, Valdir; OBEDIÊNCIA MISSIONÁRIA E PRÁTICA, São Paulo: ABU, 1.997 p. 88 
(3) ZABATIERO, Júlio P. T.; ESPIRITUALIDADE MISSIONÁRIA, Artigo da Secretaria de Missões da IPIB - Londrina, 1.991, no 2
(4) Idem
(5) GONDIM, Ricardo; FIM DO MILÊNIO: Perigos e desafios da pós-modernidade na igreja, São Paulo: Abba Press, 1.997 p. 30
(6) Idem, p. 81 
(7) Ibidem, p. 90

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