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domingo, 17 de janeiro de 2010

VIVENDO E APRENDENDO COM C.S.LEWIS - II

Parte XIII b
VIVENDO E APRENDENDO COM C.S.LEWIS

I. Lewis mesmo confessa que o seu lado “imaginativo” era, de fato, o mais amadurecido:

O homem imaginativo em mim é mais velho, mais continuamente operativo e, neste sentido, mais fundamental do que qualquer um dos outros, o religioso e o crítico. Ele me fez, pela primeira vez, aventurar-me como poeta. Ele é que, numa réplica à poesia dos outros, tornou-me um crítico e, em defesa a esta réplica, tornou-me muitas vezes um crítico paradoxal. Foi ele que, após a minha conversão, levou-me a encarnar minha fé religiosa em formas simbólicas ou mitopoéticas de um Screwtape, até um tipo de ficção científica teológica. E é claro que foi ele que me levou, nos últimos anos, a escrever a série de contos narnianos, destinados a crianças; não porque eu estivesse preocupado com o que elas queriam ouvir, o que me comprometeria a fazer adaptações (o que felizmente não foi necessário...), mas porque o conto-de-fadas foi o melhor gênero literário que eu encontrei para expressar o que pretendia dizer.29

Por outro lado, quem é que hoje em dia ainda se dá ao luxo de ler “contos da carochinha” (que já adquiriram um forte sentido pejorativo)? A falta de um realismo equilibrado predominante deve-se em parte à falta de leitura ou à limitação à literatura insossa “dos fatos,” que nos leva à inversão de valores. Essa inversão, por sua vez, gera uma alienação e desarticulação da teoria e da prática, que, justificando-se cada qual a si mesma, perde o seu efetivo valor, recaindo alternadamente nos extremos do dogmatismo e do ativismo:

Lembre-se de que acreditar na virtude do “fazer pelo fazer” é um traço (...) do espírito moderno: o sentimento de preocupação pode não passar de inquietações ou oscilações auto-afirmativas da nossa auto-imagem. Como (George) MacDonald já dizia, “o sagrado pode ter um viés do profano.” E, ao nos empenharmos em cumprir deveres desnecessários, podemos estar nos tornando menos dispostos para cumprir com os nossos verdadeiros compromissos, cometendo, assim, um tipo de injustiça. Temos que dar uma chance não somente a Maria, mas também a Marta!30

Se observarmos as práticas de ensino nas escolas de hoje, veremos o império do exagero e da falta de moderação (o inchaço de currículos, o fazer pelo fazer, a falta de continuidade, organicidade, integração entre as práticas educacionais e o faz-de-conta). O realismo, a objetividade e a coerência no planejamento do ensino (na seleção de conteúdos, procedimentos metodológicos e atividades educacionais para cada fim proposto) são virtudes em franca extinção nos meios educacionais de hoje. Mesmo nas igrejas podemos observar práticas pedagógicas de pouco nexo com a filosofia cristã de vida. Nesse sentido, Lewis é duro, direto e enfático em sua exortação contra os chamados “educadores cristãos”:

Quando os educadores cristãos fazem questão de lembrar a seus irmãos a importância da constituição do lar cristão — e penso que a lembrança é perfeitamente pertinente — a primeira coisa a se fazer é acabar com o “faz-de-conta” em torno da vida do lar...: 1. Nenhuma organização ou modo de vida, não importa qual seja, tem uma tendência natural para o bem, e isso desde a queda do homem... 2. É preciso considerar com cuidado o conceito de “conversão” ou “consagração da vida em família,” que deve significar algo além da preservação do “amor,” no sentido de afeição natural. 3. Devemos reconhecer os perigos eminentes contidos na principal característica da vida doméstica, que é, no senso comum, colocada como sua atração principal: de ser o lugar onde “nos revelamos como realmente somos.” 4. Como as pessoas devem, então, comportar-se em casa? 5. Finalmente, podemos ensinar que, se o lar é para ser um instrumento da graça, deve ser também um lugar que mantém certas regras? Não pode haver vida em comum sem regras. A única alternativa à regra não é a liberdade, mas uma ilegítima (e muitas vezes inconsciente) tirania do membro mais egoísta sobre os outros.31

Sendo uma filosofia do sentido da vida, o cristianismo é a mais didática de todas as teologias, pois para fazermos frente aos desafios da vida e das mudanças históricas, o melhor meio é, partindo dos “fatos nus e crus,” abrir portas para o sentido mais profundo das coisas, para o seu verdadeiro destino e vocação.

Assim, o que se espera do educador cristão autêntico é que pare de queixar-se da falta de tempo e recursos e busque a coerência entre o que professa e as práticas concretas do seu cotidiano. Pois:

se nós realmente acreditamos naquilo em que dizemos crer — se realmente cremos que o nosso lar está em outro lugar e que esta vida é uma “peregrinação em sua busca,” por que não olhamos para frente, rumo à chegada?32

Foi quando Lewis parou de correr atrás da sua concepção de felicidade e olhou para a realidade, que deu a chance que Deus esperava para surpreendê-lo com algo ainda maior do que era capaz de sonhar: o amor verdadeiro, do qual esteve fugindo todo o tempo.

Nesse sentido é que grandes psicanalistas, como Bruno Bettelheim, têm insistido em afirmar que os contos-de-fada, longe de ser uma mera forma de “escapismo” ou meio de fuga diante dos problemas da vida real, são altamente didáticos e até terapêuticos.33 Aliás, a literatura, particularmente a imaginativa, tem este misterioso e aparentemente contraditório poder de captar a essência da experiência humana (permeada pela dor e o sofrimento) e transformá-la em sabedoria de vida. É isso que se pode constatar, ao menos, nas parábolas bíblicas. A educação pela imaginação, exemplificada nos contos-de-fada e nas parábolas, abriga um poderoso potencial pedagógico ainda pouco explorado ou mal aplicado nos meios educacionais.

Não se trata, entretanto, de uma receita mágica. Para se obter bons resultados com essa metodologia, principalmente no mundo atual, dominado pelo imediatismo e consumismo (é perfeitamente possível, por exemplo, que uma criança ouça um provérbio, ou uma parábola como a do O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa sem chegar a nenhuma conclusão mais profunda!), é preciso que se adote uma postura didática adequada. Nesse sentido é que a imagem de Cristo é tão ilustrativa. Nas palavras do tão simpático personagem, o castor, ele não fica exibindo toda a sua glória a todo instante, nem fica a explicar as coisas nos seus mínimos detalhes a todo o mundo. Ele escolhe muito bem os momentos e as palavras certas para dar o seu recado. Assim, tudo que está relacionado ao nome de Aslan permanece coberto de uma aura de mistério. Trata-se de um animal realmente feroz, um ser selvagem, caçador, que não é domesticável. Por outro lado, Aslan é, ao mesmo tempo “Bom, muito bom!” Essa imagem contém todos os elementos essenciais de Cristo na doutrina cristã. Não é para menos que Lewis diz, em uma de suas cartas, que O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa é a sua obra principal e mais amadurecida.

Nessa linha de pensamento, G. K. Chesterton diz que a postura certa é a que, com moderação, considera os dois lados, da razão e bom senso e da imaginação e criatividade, deixando Deus iluminar ambos com sua mente. Esta é a moral dos contos-de-fada (e é nessa filosofia que se fundamenta igualmente a “filosofia da educação” narniana), que não passam do “país ensolarado do senso comum,” onde não há “leis,” regras ou classificações. Estas, de fato, são generalizações totalmente anti-intelectuais, de tão raramente que ocorrem na realidade (se é que ocorrem), nas quais não é o homem que cria a ciência, elaborando juízos sobre a natureza, mas a ciência é que cria o homem, julgando a natureza a partir de um pressuposto sobrenatural. No mundo das fadas, as palavras de ordem são “charme”, “magia”, “encanto,” expressando o princípio da incerteza e do mistério, que nos torna mais humildes e gratos pela vida, trazendo-nos de volta ao chão da realidade, que é o da ignorância e do esquecimento até de nós mesmos:

Ame o Senhor nosso Deus, mas não tente conhecer-se a si mesmo. Somos todos vítimas da mesma calamidade intelectual; todos nós esquecemos nossos nomes; todos nós esquecemos o que realmente somos. Tudo o que chamamos de bom senso, racionalidade, praticidade e positivismo justifica-se pelo simples fato de que, devido a certos pontos mortos da nossa história de vida, esquecemos que esquecemos... Conforme explicava, os contos-de-fada fundaram em mim duas convicções: em primeiro lugar, este mundo é um lugar selvagem e chocante, que poderia ter sido muito diferente, mas que doravante é bastante prazeroso; em segundo lugar, antes desta selvageria e prazer, devemos ser modestos o suficiente para nos submeter, com simplicidade, aos limites do mistério. Sempre acreditei que o mundo envolvesse magia; hoje penso que é mais provável que envolva um mágico.34

Em síntese, o que Chesterton diz é: a babá que narra os contos-de-fadas é a guardiã da tradição e da própria democratização da sabedoria e do conhecimento. Nada há de mais plausível e confiável do que os contos-de-fadas, que nos fazem ver as coisas como realmente são: encantadoras demais para podermos racionalizá-las, restando-nos apenas admirá-las, glorificando o Criador.

E. Apre(e)nder pela literatura
O segredo da didática de Lewis, então, parece encontrar-se nessa tentativa de traduzir em literatura imaginativa e bem humorada, que também apela para a razão, o que aprendeu por experiência: que, embora possa vir a tornar-se um caminho enganoso, se perdermos a moderação, admirando a criatura em lugar do Criador (vaidade das vaidades), a literatura tem o potencial ainda pouco explorado pelos educadores de motivar o educando a buscar algo que vai além da letra morta, e nos conduzir de volta ao caminho rumo ao nosso lar esquecido.

A maior prova disso encontra-se na própria conversão de Lewis. Depois de cair no ceticismo ou anti-intelectualismo, após a descoberta de que a felicidade não se encontrava nas coisas que buscava, de repente acabou fazendo uma descoberta ainda maior: que a felicidade encontra-se para além dessas coisas, que não passam de sinais (daí vem ensinar) indicativos do caminho que leva a ela. Por esse exemplo de vida podemos notar que, precisamente por não ser “domesticável,” Deus se manifesta, sem pedir licença, a quem ele quiser e da forma que ele escolher. F. Aprendendo a aprender
A metodologia proposta por Lewis na sua literatura, que parte sempre da experiência viva e real, traduzida e capturada pela linguagem imaginativa, visa abrir mais e mais caminhos ou vias de comunicação do evangelho ao ser humano. Essa metodologia das “portas abertas” tem o potencial de alcançar tanto cristãos desmotivados ou amortecidos pelo desânimo, quanto não cristãos, que esqueceram que Cristo é a única fonte da alegria verdadeira, capaz de preencher os vazios da natureza caída, reconciliando o homem com Deus e consigo mesmo. Evidentemente, essa felicidade, que podemos esperançosamente manter em mira através da literatura, nunca será totalmente realizada neste mundo, que, por isso mesmo, não passa de uma “terra das sombras” da verdadeira realidade que ainda está por vir.

Assim, podemos dizer, em síntese, que, de acordo com Lewis, a melhor maneira de o educador cristão preparar-se para o século XXI é “ver as coisas como são,” aplicando a literatura, método ainda pouco desenvolvido na educação cristã, como meio para abrir oportunidades à discussão de conceitos fundamentais, tais como realidade, razão, fé e imaginação. Dessa maneira, se poderá construir um projeto pedagógico capaz de nortear todos os educadores cristãos interessados em aprender a fazer frente aos desafios futuros, equipando-se com fé, razão, coragem e muita imaginação.

As Crônicas de Nárnia, lançadas pela Editora Martins Fontes na bienal do livro de 1997, é uma série de contos infantis que inclui: O Sobrinho do Mago, O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa (que se encontra em desenho animado pela Reborn Vídeo), O Cavalo e seu Menino, Príncipe Caspian, A Viagem do Peregrino da Alvorada, A Cadeira de Prata e A Última Batalha.
C. S. Lewis, Surprised by Joy (Nova York: Harcourt Brace, 1954), traduzido como Surpreendido pela Alegria (São Paulo: Editora Mundo Cristão, 1998).
Da coleção de “Pensadores Clássicos” da Editora Mundo Cristão. Dessa coleção podemos citar ainda O Grande Abismo, além da coleção das Crônicas de Nárnia, hoje editadas pela Editora Martins Fontes. Outras obras de Lewis são Cristianismo Puro e Simples (ABU Editora) e O Peso da Glória (Vida Nova).
Ainda que isso não seja bem verdade no Brasil, onde grande parte desses livros já se encontram esgotados, eles continuam bastante citados e aplicados, tanto nas Escolas Dominicais e reuniões diversas nas igrejas, quanto nos meios estudantis cristãos ou não.
Colin Duriez, The J. R. R. Tolkien Handbook: A Comprehensive Guide to His Life, Writings, and World of Middle-Earth (Grand Rapids: Baker, 1992), 130.
C. S. Lewis, Letters to Malcolm (Nova York: Harcourt Brace, 1963), 76.
C. S. Lewis, Letters to an American Lady, ed. Clyde S. Kilby (Grand Rapids: Eerdmans, 1971), 55.
A carta é de 26/4/56.
Peter Kreeft, Buscar Sentido no Sofrimento (São Paulo: Edições Loyola, 1995), 100.
Ibid., 61.
Lewis, Letters to an American Lady, 79 (carta de 30/10/58).
C. S. Lewis, The Allegory of Love (Oxford: Clarendon Press, 1936).
C. S. Lewis, Studies in Medieval & Renaissance Literature (Cambridge: Cambridge University Press, 1996; 4a. edição), 44.
Tomás de Aquino, Summa Contra Gentiles, em Os Pensadores, Vol VIII (São Paulo: Abril Cultural, 1973). Lewis, Studies in Medieval & Renaissance Literature, 59. Ibid., 72. Ibid., 82.
Guilherme de Lorris (1200-40), poeta francês autor dos primeiros quatro mil versos de 22.000 do poema Le roman de la rose.
A segunda parte foi escrita pelo poeta também francês Jean de Meun. C. S. Lewis, Cartas do Diabo a seu Aprendiz (Petrópolis: Vozes, 1996), 9.
A Loyola manteve o nome original em inglês Screwtape. De fato, é difícil expressar a totalidade do significado desse nome em português, que lembra “verme”, “lombriga,” enfim, um parasita asqueroso que vai se enrolando em torno de si mesmo. Lewis, Cartas do Diabo a seu Aprendiz, 11.
John R. Stott, Crer é também Pensar (São Paulo: ABU Editora, 1978), 7-8.
Somente para citar um exemplo, devemos mencionar a excelente revista Didaquê, usada como material didático em escolas dominicais de diversas denominações, por todo o Brasil.
Lewis, Cartas do Diabo a seu Aprendiz, 12
Ibid., 12-13.
Ibid., 13-14.
Odero & Odero, Imagen del Hombre (Pamplona: EUNSA, 1993), 369.
C. S. Lewis, An Experiment in Criticism (Cambridge: Cambridge University Press, 1961), 120.
Lewis, Letters to an American Lady, 16 (carta de 22/6/53).
Walter Hooper, C. S. Lewis, A Companion and Guide (São Francisco: Harper Collins, 1996).
Ibid., 53 (carta de 19/3/56).
C. S. Lewis, God in the Dock: Essays on Theology and Ethics, ed. W. Hooper (Grand Rapids: Eerdmans, 1970), 284ss.
Lewis, Letters to an American Lady, 84 (carta de 7/6/59).
Os relatos completos das experiências impressionantes de Bruno Bettelheim com o tratamento de crianças deficientes mentais a partir dos contos-de-fadas pode ser lido na sua obra: A Psicanálise dos Contos de Fadas (Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980). Ele diz: “É uma característica dos contos de fadas colocar um dilema existencial de forma breve e categórica. Isto permite à criança aprender o problema em sua forma mais essencial, onde uma trama mais complexa confundiria o assunto para ela. O conto-de-fadas simplifica todas as situações” (p. 15).
G. K. Chesterton, “Orthodoxy,” texto eletrônico disponível na internet no endereço: http://www.dur.ac.uk/~dcs0mpw/gkc/books/ortho14.txt
Fonte: Revista Fides Reformata


Estude com fé depois de ter terminado os seus estudos, envie seu questionário com as respostas devidas para o endereço de e-mail: teologiagratis@hotmail.com, se assim quiser, logo após respondido e corrigido o questionário, alcançando media acima de 7,5, solicite o seu Lindo DIPLOMA de Formatura e a sua Credencial de Seminarista formado, também poderá solicitar estagio missionário em uma de nossas igrejas no Brasil ou exterior traves da Federação Internacional das Igrejas e Pastores no Brasil ou Fenipe, que depois do Estagio se assim o achar apto para o Ministério poderá solicitar a sua ordenação por uma de nossas organizações filiadas no Brasil ou no exterior, assim você poderá também receber a sua Credencial de Ministro Aspirante ao Ministério de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Esta apostila tem 98 pagina boa sorte.

Sem nadas mais graça e Paz da Parte de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo bons estudos

Reverendo Antony Steff Gilson de Oliveira
Pastor da Igreja Presbiteriana Renovada de Nova Vida
Presidente da Federação Internacional das Igrejas e Pastores no Brasil ou Fenipe

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