Páginas

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

II - ÉTICA NA CAPTAÇÃO DE RECURSOS

Parte II
ÉTICA NA CAPTAÇÃO DE RECURSOS

Autor(a): PR. LUIZ ROBERTO FRANÇA DE MATTOS

Doar dinheiro é uma coisa fácil e está dentro do poder de qualquer ser humano. Mas decidir a quem, quanto, quando e para que propósito doá-lo não está dentro do poder de cada pessoa, nem é uma coisa fácil. (Aristóteles, Ética a Nicômaco)




Resumo


O processo de captação de recursos pode ser a fonte de sérios dilemas morais relacionados à missão da organização que se beneficia dos fundos, ao captador de recursos e até mesmo à relação entre a primeira e este último.

A perspectiva antropológica - básica para a captação de recursos - que vê seres humanos como capazes de realizar bons atos morais e de ter um caráter virtuoso deveria ser considerada como fundamentada na Escritura e na teologia reformada. Conseqüentemente, tanto esta perspectiva quanto a filantropia deveriam ser valorizadas e incentivadas. A captação de recursos requererá uma ênfase no diálogo e no cultivo de virtude por parte daqueles lidando com suas questões morais inerentes. Tal ênfase, entretanto, não significa que se deva descartar um modelo deontológico baseado na lei moral revelada na Escritura, e mais especificamente no Decálogo, como o fundamento das decisões morais. O compromisso - e mesmo a submissão - a tal moralidade deontológica permitiria o desenvolvimento de uma ética de captação de recursos que evitaria a adoção de sistemas éticos alternativos em que decisões morais são tomadas primariamente com base na situação e no thelos a ser alcançado.

PALAVRAS-CHAVE:


antropologia, captação de recursos, deontologia, ética, virtude.



Introdução


A credibilidade do mercado financeiro internacional foi duramente afetada no ano de 2002 com os escândalos envolvendo a Enron, a Andersen, a WorldCom e a Tyco International, entre outras empresas. A Enron, outrora a sétima maior companhia dos Estados Unidos, comprava eletricidade dos produtores e a revendia aos consumidores, utilizando-se, por vezes, de suas parcerias no exterior para mascarar problemas financeiros e continuar recebendo dinheiro e crédito. Na esteira da Enron, a Andersen foi envolvida numa crise de proporções gigantescas. Uma das cinco maiores firmas de auditoria do mundo, a Andersen era responsável por auditar as contas da Enron, uma das empresas preferidas de Wall Street. Porém, paralelamente, a Andersen atuava como consultora da Enron, desenvolvendo uma atividade que envolvia um claro conflito de interesses e um problema moral, se não legal.

Não se deve supor, porém, que as ações censuráveis que ganharam a atenção da mídia constituam-se em paradigmas da realidade do mercado. Em sua obra Beyond Integrity: A Judeo-Christian Approach to Business Ethics, Scott B. Rae and Kenman L Wong demonstram que este é apenas um lado da história. Dois notáveis exemplos de ações moralmente louváveis - a decisão de Aaron Feuerstein de reconstruir sua tecelagem após um incêndio que a reduziu a cinzas, duas semanas antes do Natal de 1995 e a determinação da Companhia Farmacêutica Merck & Co. de destinar US$ 20 milhões de seu orçamento anual para a produção e envio do remédio para a cura de uma doença ribeirinha - demonstram que "há muitas corporações... cujas declarações de missão e ações assemelham-se às dos cidadãos mais louváveis."

A preocupação com o estudo da moralidade no contexto da economia de mercado tem suscitado amplo interesse com a publicação de uma literatura especializada no campo da Ética dos Negócios. Contudo, uma avaliação da bibliografia disponível neste campo revela uma atenção ainda reduzida ao tópico do interesse específico deste artigo, a saber, a Ética na Captação de Recursos. Duas das exceções à regra são as obras de Marilyn Fischer e de Albert Anderson.

Após conceituar alguns termos fundamentais, oferecer indicações da relevância do assunto e identificar áreas de tensão moral existentes na captação de recursos numa primeira seção, analisar-se-ão algumas pressuposições antropológicas relacionadas à prática do levantamento de recursos com fins filantrópicos à luz do ensino da Escritura e de alguns documentos da teologia reformada. Uma breve discussão de alternativas ao modelo proposto por Fischer - Ética como Narrativa - será desenvolvida na terceira seção deste artigo, concluindo que um modelo deontológico, associado à ênfase à virtude, evitaria alguns dos dilemas morais em que a proposta de Fischer parece incorrer.



Captação de Recursos: Resumo



Terminologia, Relevância do Assunto e Áreas de Tensão Moral
A captação de recursos é definida por Custódio Pereira como "uma sofisticada arte que é freqüentemente descrita como a mais sofisticada de todas as formas de relações públicas." Esta atividade, realizada na maioria das vezes de maneira amadora e improvisada no Brasil, constitui o chamado "terceiro setor" da economia que engloba organizações filantrópicas e outras organizações sem fins lucrativos.

Filantropia, entende Fischer, "é provavelmente melhor descrita listando o que ela tem feito do que tentando oferecer uma definição unificada." A autora apela para a obra de O'Connell intitulada Philanthropy in Action [Filantropia em Ação] para identificar as múltiplas áreas promovidas pela filantropia, a saber, a descoberta de novas fronteiras do conhecimento, o apoio e o encorajamento da excelência, a capacitação de pessoas para o exercício de seu potencial, o alívio da miséria humana, a preservação e a otimização do governo e instituições democráticas, a melhoria da vida comunitária, o nutrimento do espírito, a criação de tolerância, entendimento e paz entre as pessoas e, finalmente, a preservação da memória dos mortos. Em suma, filantropia diz respeito a "criar e sustentar comunidades - comunidades de lugar, de escolha, de propósito, de compromisso, de interesse." Ainda que se possam oferecer definições alternativas para filantropia, sua importância pode ser percebida simplesmente atentando para o valor a ela atribuído por Aristóteles. Ao lado da justiça, a filantropia é considerada como a única outra virtude moral fundamental para o bem-estar humano. O objetivo de organizações filantrópicas é, portanto, "a promoção de um propósito público, a melhoria do bem comum."

Estima-se que o terceiro setor movimentou R$ 12 bilhões e gerou 1,7 milhão de empregos no Brasil, em 1999, números que embora expressivos tornam-se insignificantes se comparados à realidade norte-americana. Segundo Pereira, No ano de 2000, os americanos doaram 203,45 bilhões de dólares para instituições sem fins lucrativos, o que representou um aumento de 6,6% em relação ao ano anterior... Esses números mostram a relevância das doações e o interesse que os americanos vêm demonstrando em apoiar a ação social, a arte e a cultura, a saúde e a educação.

Falta de conhecimento do assunto, ausência de literatura, de dados estatísticos e de informações acuradas sobre como captar recursos, bem como de métodos adequados, de estímulo, de incentivos fiscais, e de credibilidade das instituições beneficiadas são alguns dos fatores listados como responsáveis pela diferença significativa entre o volume de recursos captados nos Estados Unidos e no Brasil. Merece destaque, porém, o fato de que em 1999 já existiam no Brasil 250 mil ONG's e 14 mil fundações, a maioria delas criada nos últimos 16 anos. O potencial de recursos para investimento em causas filantrópicas é também significativo. A necessidade da discussão da Ética na Captação de Recursos se evidencia tanto a partir de exemplos contemporâneos quanto do passado. Em 1996, o Conselho Nacional de Igrejas nos Estados Unidos (NCC) lançou uma campanha para captação de recursos visando a reconstrução de igrejas queimadas, a maioria das quais usadas por congregações negras ou miscigenadas. Esta campanha levantou mais de US$ 9 milhões em doações e empréstimos de diversas fontes, desde fundações até indivíduos. A despeito do sucesso na captação de recursos, The Wall Street Journal publicou um artigo de primeira capa, em sua edição de 9 de agosto de 1996, denunciando que o NCC vinha lutando com dificuldades para levantar dinheiro para programas de justiça racial, mas ao conectar os incêndios com a ação "orquestrada de grupos de supremacia branca, levantou mais dinheiro mais rapidamente do que o fez em qualquer causa anterior." O mesmo artigo, acrescenta o articulista do The Christian Century, questionava o uso da contribuições pelo NCC, suspeitando que parte do dinheiro estivesse sendo usado para outros propósitos além da reconstrução das igrejas. A Secretária Geral do NCC respondeu às denúncias afirmando que 85% do montante levantado seria usado na reconstrução e 15% em programas relacionados ao racismo, com base no seguinte argumento: "Devemos assumir uma abordagem holística a menos que desejemos reconstruir igrejas somente para vê-las queimar novamente. Nós queremos que os ataques às igrejas motivados pelo ódio parem." A despeito do arrazoado do NCC, a denúncia feita pelo The Wall Street Journal levanta um questionamento moral legítimo: A utilização (parcial) dos recursos levantados com uma finalidade específica - a reconstrução de igrejas queimadas - em outro fim apenas indiretamente relacionado ao propósito específico alegado para o levantamento é moralmente permissível? Esta questão aponta para uma das áreas em que problemas morais podem ocorrer na captação de recursos, a saber, nas relações entre captadores de recursos e doadores. Outros exemplos contemporâneos poderiam ser facilmente multiplicados. Não obstante, um exemplo clássico de uma captação de recursos bem sucedida é suficiente para demonstrar de modo indiscutível a importância da definição de princípios para que tal captação seja moralmente legítima. No século XVI, John Tetzel destacou-se como um captador de recursos extraordinariamente bem sucedido através da venda de indulgências. O reconhecimento da doação era feito através de um documento da Igreja Católico-Romana garantindo o perdão de pecados para o próprio doador ou para alguém em favor de quem a doação era feita. O moto de Tetzel era; "Tão logo a moeda alcança o fundo do cofre, a alma emerge do purgatório."

Por que a formidável captação de recursos promovida por Tetzel deveria ser considerada moralmente reprovável? Simplesmente porque os recursos levantados feriam a missão fundamental da Igreja, a saber, ser instrumento para a salvação de almas. A missão da organização que capta os recursos é, portanto, uma segunda área de tensão moral.

Não é difícil imaginar situações em que a falta de integridade pessoal do captador de recursos seja responsável por problemas morais quer pela omissão ou distorção de informações quanto à missão da organização, quer pela aceitação de recursos que firam a missão da mesma. Não é o propósito deste artigo aprofundar a discussão de problemas específicos relacionados a cada uma destas áreas de tensão, a saber, na (in)definição da missão da organização, nas relações profissionais entre doador e captador, e na falta de integridade pessoal do captador.

É conveniente, porém, destacar que Fischer observa com propriedade que "dificuldades éticas geralmente envolvem falta de alinhamento entre a missão da organização e as decisões diárias." Olhando para o ensino da Escritura acerca do assunto, constata-se que o Novo Testamento menciona ao menos um exemplo de captação de recursos. Porém, a falta de maiores informações a respeito do evento recomenda cautela em sua utilização, exceto talvez para afirmar a preocupação de Paulo, no sentido de que a idoneidade moral do agente que encaminharia a oferta levantada pelas igrejas da Macedônia para os pobres da Judéia - Tito, recomendado como "o irmão cujo louvor no evangelho está espalhado por todas as igrejas" (2 Coríntios 8:18), garantisse a transparência do processo de captação e envio dos recursos.

Pressuposições Antropológicas Envolvidas na Captação de Recursos Na identificação de algumas pressuposições antropológicas envolvidas na captação de recursos, recorrerei primariamente à obra de Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising. É minha convicção que as características por ela atribuídas ao ser humano expressam um entendimento comum do assunto do ponto de vista da filantropia.

Fischer inicia o primeiro capítulo de seu livro com um parágrafo destinado ao seu público-alvo que revela alguns de suas pressuposições antropológicas. Segundo a autora:

Este livro é escrito para captadores de recursos trabalhando para organizações filantrópicas e para outras organizações que apreciam a filantropia como um modo de criar e de enriquecer a vida comunitária. A maioria dos que se enquadram nesta descrição são pessoas compassivas, honestas e decentes, que já têm considerável perícia em tomar decisões éticas e agir de maneiras que demonstram sensibilidade ética. Eles já se esforçam por serem confiáveis, para agir com integridade e tratar outros com decência e respeito.

O objetivo de Fischer é "entremear tecidos organizacionais de modo que pessoas de decência e coragem usuais possam se sair bem." A mesma idéia é retomada pouco adiante nos seguintes termos:

Meu alvo neste livro é ajudar pessoas de decência e coragem usuais a alcançar seus propósitos, ajudá-las a construir organizações em que santidade não é um requisito para o sucesso, mas onde possuir decência e coragem usuais é suficiente.

Logo, Fischer crê que seres humanos são capazes de agir com honestidade, decência e coragem, inclusive criando modelos sócio-economicos alternativos- como o das Ilhas Trobriand (vide nota de rodapé 12) - onde um sistema serial de presentes oferecidos ao próximo convive com a economia de mercado e estimula o bem-estar comunitário sem um propósito egocêntrico.

Mais do que meros seres biológicos vinculados a um meio-ambiente físico, seres humanos usam as artes, a cultura e símbolos religiosos e culturais como parte do processo de descoberta de sua própria identidade, e são capazes do exercício de virtudes como altruísmo, generosidade, caridade, compaixão, gratidão, mutualidade e integridade. Fischer se refere a virtudes no sentido Aristotélico do termo, como "características permanentes e estáveis da personalidade."

De modo a evitar um alongamento inconveniente deste ensaio, apenas duas das virtudes mencionadas serão objeto de atenção, a saber, altruísmo e integridade. Por que seres humanos agem com altruísmo em determinadas situações? Por que circunstancialmente se dispõem até a sacrificar suas próprias vidas por outros seres humanos? Fischer lança mão de uma obra de Kristen Renwick Moroe (The Heart of Altruism: Perceptions of a Common Humanity [O Coração do Altruísmo: Percepções de uma Humanidade Comum] para responder estas questões. Segundo ela, o fundamento de uma postura altruísta é simplesmente a consciência de que todo indivíduo co-participa de uma "humanidade comum." Isto, contudo, não responde à questão por quê determinadas pessoas - talvez a maioria - não reage com altruísmo seja ante o drama dos judeus na guerra, seja diante de necessidades básicas de seus semelhantes. Falta-lhes percepção racional ou intuição acerca de sua humanidade comum? Independentemente da resposta a esta questão, o fato permanece que uma parcela de seres humanos reage com altruísmo ante determinadas necessidades.

Seres humanos em geral - e captadores de recursos em particular - devem cultivar integridade pessoal, acrescenta Fischer. Integridade é definida tanto como harmonia da alma e fidelidade a ideais, quanto como o exercício de uma responsabilidade confiável e flexibilidade.

Em sua discussão de integridade como virtude a ser desenvolvida, Fischer apresenta duas faces intrinsecamente conflitantes. Primeiro, integridade é definida em termos individuais. Em suas palavras, integridade "é o mais próximo que [alguém] se aproxima de identificar a qualidade moral de si mesmo, de seu próprio companheiro absoluto... Você é aquele perante quem você é em última análise responsável." Complementarmente, integridade também é definida em termos sociais. Fischer parece endossar a tese proposta por Jane Addams de que devemos "afastar nosso foco de nossa inteireza [ou integridade] individual, concentrando-o em nossas atividades em conexão com outras pessoas." Assim, conclui Fischer:

Nós necessitamos de um modo de entender integridade que nos faça sentido quanto às nossas vidas como seres sociais com múltiplas identidades, vivendo em múltiplas comunidades e com múltiplos compromissos com outras pessoas.

O exemplo para o qual Fischer apela é elucidativo, ainda que perturbador. Ela cita a filósofa Maria Lugones, a quem ela descreve como lésbica e hispânica, como um paradigma de integridade. Sua comunidade étnica, argumenta Fischer, é preconceituosa acerca de sua opção sexual. A despeito da tensão envolvida, Maria Lugones não deseja abrir mão nem de sua opção pelo lesbianismo nem de suas raízes latinas. De acordo com a visão de integridade de Fischer, Maria Lugones deve mover-se entre ambas as comunidades [de lésbicas e hispânicos] exercitando flexibilidade e sendo forte, evidenciando que membros das duas comunidades podem contar com seu amor e participação. Segundo Fischer, Lugones pode ser uma pessoa de integridade "sem necessitar alcançar uma harmonia interna."

Parece evidente que este conceito de integridade suscita sérias questões morais do ponto de vista da captação de recursos. Seria admissível que um captador de recursos pertencente a diferentes comunidades com interesses conflitantes pudesse desenvolver sua atividade de modo moralmente permissível, independente dos conflitos internos existentes, simplesmente apelando para a conclusão lassa proposta por Fischer?

Ainda mais, integridade é definida em termos teleológicos , pois Fischer a conecta com uma perspectiva de crescimento pessoal, propondo que decisões morais devem levar em consideração a seguinte questão: "De que maneira esta alternativa ajuda ou não você a desenvolver-se na pessoa que você quer se tornar?" Não parece difícil imaginar que sobre este fundamento teleológico, decisões morais não permissíveis sob uma perspectiva deontológica pudessem eventualmente ser consideradas como legítimas.

Anderson, seguindo uma linha semelhante à de Fischer, entende que os praticantes da filantropia têm bons instintos morais. Tais instintos, crê Anderson, são intuídos pelos agentes morais envolvidos na filantropia - sejam doadores, sejam captadores de recursos. A consciência é a fonte destes instintos morais, acrescenta Anderson sem definir se, em seu entendimento, ela deveria ser compreendida como uma realidade inata implantada por Deus ou como uma resposta condicionada aprendida em nosso convívio social.

Portanto, do ponto de vista da captação de recursos, seres humanos devem ser considerados capazes do exercício de virtudes como altruísmo e integridade entre outras mencionadas. No entender de Fischer, a captação de recursos deve ser desenvolvida a partir destes pressupostos antropológicos, aplicáveis tanto ao potencial doador quanto ao captador. Em última análise, seres humanos devem ser considerados capazes de almejar e praticar o bem.

Seriam estas pressuposições antropológicas compatíveis com os princípios bíblicos e com a teologia reformada? A próxima seção deste ensaio oferecerá uma resposta a esta questão avaliando passagens da Escritura e textos de documentos reformados que lançam luz sobre a mesma.



Fundamentos Teológicos: Quem Pode Fazer o Bem?



Diversos textos da Escritura são enfáticos em afirmar a incapacidade do ser humano em fazer o bem. Escrevendo à Igreja em Roma, o apóstolo Paulo retoma o tema dos Salmos 14 e 53 e descreve o estado de pecado do ser humano nos seguintes termos: "Não há justo, nem um sequer, não há quem entenda, não há quem busque a Deus; todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer" (Romanos 3:10b-12, minha ênfase). O diagnóstico da condição espiritual de todo ser humano é claro: ele é por natureza injusto, sua capacidade cognitiva está afetada especialmente no que diz respeito à sua compreensão da vontade e caráter de Deus, todos os seus esforços são inúteis no que tange a cumprir as exigências do seu Criador. Em suma, nenhuma de suas ações pode ser considerada intrinsecamente boa, uma vez que o padrão santo de Deus seja estabelecido como critério.

O diagnóstico de Romanos 3 é perfeitamente compatível com diversas outras afirmações da Escritura que apontam para o estado de corrupção do ser humano após a queda. Como um exemplo, temos Gênesis 8:21 onde lemos: "E o Senhor... disse consigo mesmo: Não tornarei a amaldiçoar a terra por causa do homem, porque é mau o desígnio íntimo do homem desde a sua mocidade [ou infância, segundo o texto original]..." Ainda que o texto de Gênesis 8:21 vincule esta condição à infância - uma tradução alternativa do vocábulo hebraico naur - o ensino geral da Bíblia deixa claro que esta é uma condição constitutiva de todo ser humano desde sua concepção. Conforme o salmista Davi, todo ser humano nasce em iniqüidade e é concebido em pecado (Salmo 51:5). O Catecismo de Heidelberg ratifica esta afirmação em sua resposta à questão 7, onde se lê que a queda e desobediência dos progenitores da raça humana "envenenou, ou corrompeu nossa natureza de tal forma que nascemos pecadores - corruptos desde nossa concepção." Este estado de corrupção, acrescenta o mesmo Catecismo, torna o ser humano incapaz de fazer qualquer bem e inclinado a todo mal, "a menos que sejamos nascidos de novo pelo Espírito de Deus."

A despeito deste trágico diagnóstico, outras passagens da Escritura referem-se a seres humanos regenerados pela ação graciosa de Deus como capazes de fazer o bem. Na parábola dos talentos, Jesus ensina que alguns servos receberam a aprovação do seu senhor, sendo individualmente chamados de "servo bom e fiel." (Mateus 25:21, 23). O próprio apóstolo Paulo, escrevendo aos cristãos de Corinto, manifesta sua confiança de que a graça de Deus seria capaz de fazê-los abundar "em toda boa obra." (2 Coríntios 9:8, minha ênfase). Semelhantemente, o apóstolo Pedro em sua primeira epístola exorta os cristãos a viverem exemplarmente, de modo que suas boas obras motivassem os incrédulos a glorificar a Deus no dia da visitação - provavelmente numa referência a ação misericordiosa de Deus visitando estes mesmos incrédulos para salvá-los.

O ensino de que seres humanos regenerados são capazes de fazer o bem é ratificado pela Confissão Belga em seu artigo 24, onde lemos que é a fé que "leva o homem a fazer as obras que Deus ordenou em sua Palavra." Estas obras, "procedentes da boa raiz da fé são boas e aceitáveis a Deus, desde que elas são todas santificadas pela sua graça."

Todavia, passagens da Escritura como essas acima, bem como as de alguns documentos reformados, não nos ajudam a lançar luz sobre a questão em pauta uma vez que eles afirmam que apenas pessoas regeneradas e salvas pela ação graciosa de Deus são capazes de obras boas, uma realidade que não necessariamente se aplica àqueles que praticam a filantropia.

Os Cânones de Dort (1618-19), ao tratarem da total incapacidade decorrente da corrupção da natureza humana, introduzem uma qualificação muito importante ao afirmar: "[T]odas as pessoas são concebidas em pecado e nascem como filhas da ira, inadequadas para qualquer bem salvífico, inclinados para o mal, mortos em seus pecados, e escravos do pecado..." O mesmo documento, porém, reconhece que, a despeito de sua condição decaída, permanece "com certeza uma certa luz de natureza no homem [ser humano] após a queda, em virtude da qual ele retém algumas noções sobre Deus, sobre as coisas naturais e acerca da diferença entre o que é moral e imoral, e demonstra um certo anelo pela virtude e por um bom comportamento exterior." Os mesmos Cânones se apressam em acrescentar que esta luz da natureza não só é insuficiente para conduzir o ser humano a um conhecimento salvífico de Deus, mas também que freqüentemente ela não é usada de modo apropriado até mesmo em assuntos relacionados à natureza e à sociedade.

Não há diferença conceitual entre os documentos reformados acima apresentados. O que se pode entender é que enquanto que a Confissão Belga discute os resultados da queda e regeneração a partir de categorias essencialmente soteriológicas, os Cânones de Dort, conquanto mantendo-se fiel ao ensino bíblico acerca da queda e regeneração, introduzem uma categoria que permite uma avaliação mais precisa da ação moral do ser humano não regenerado.

É possível, então, à luz do ensino da Escritura e dos documentos reformados acima citados, fazer distinção entre três tipos de bem: salvífico, regenerado e moral. O primeiro é aquele feito com vistas a satisfazer a justiça e santidade de Deus. Nenhum ser humano per se - independente dos méritos de Cristo - é capaz de fazer tal bem. O segundo é o bem realizado por aqueles que foram alcançados pela obra regeneradora de Deus. Estes são capazes de boas obras, pois estas decorrem da verdadeira fé, conformam-se com a lei de Deus e são feitas para Sua glória. O terceiro bem é aquele que se conforma às exigências exteriores da lei de Deus e é praticado independentemente de fé em Jesus Cristo ou do desejo de glorificar a Deus. A despeito de não satisfazer os quesitos para se qualificar como um bem satisfatório para a salvação, nem mesmo como um bem reconhecido por Deus como louvável, ele deve ser reconhecido como um bem real do ponto de vista da moralidade.

Dentre os reformadores, João Calvino reconhece a capacidade dos seres humanos não regenerados para boas obras nos campos cultural, científico e moral ao distinguir entre o que ele chama de coisas celestiais e terrenas. "A descoberta ou transmissão sistemática das artes," afirma ele, " é conferida indiscriminadamente sobre piedosos e ímpios, e é corretamente contada entre os dons naturais." Diante disto, Calvino exorta seus leitores a reconhecer a admirável luz da verdade brilhando nos escritores seculares, e aprender com eles, caracterizando o "Espírito da Verdade como o único fundamento da verdade," e afirmando que desprezar a verdade onde quer que ela apareça implicaria em desonrar o próprio Espírito de Deus. Conseqüentemente, Calvino reconhece que a verdade brilhou por detrás dos antigos juristas e filósofos, e que não é possível aproximar-se de seus escritos sem grande admiração e reconhecimento de que tudo louvável e nobre por eles produzido procedeu de Deus. Assim, aqueles homens que a Escritura denomina como "homens naturais" devem ser considerados "brilhantes e penetrantes" em sua investigação das "coisas terrenas ou inferiores.

Ainda segundo Calvino, a capacidade do homem não regenerado não se limita à investigação das ciências, mas ao estabelecimento da ordem cívica e da disciplina com grande equidade, incluindo, portanto, elementos morais. Retomando esta perspectiva de Calvino, Stackhouse reconhece que a graça de Deus, e não a capacidade da vontade humana profundamente afetada pelo pecado, é o fundamento por detrás das realizações do homem natural, seja num "casamento maravilhoso, numa grande escola, numa lei justa, numa ordem política pacífica..." Ainda que Fischer fundamente sua proposta filantrópica de uma economia da doação em alguns pressupostos teológicos e morais discutíveis, diversas de suas pressuposições antropológicas são, em certo sentido, consistentes com o ensino da Escritura e com a teologia reformada. Resta, finalmente, considerar a possibilidade de um modelo ético alternativo à proposta de Fischer que evite seus problemas inerentes e possa ser empregado no processo de captação de recursos.



Modelos Éticos Alternativos



Fischer reconhece com propriedade que a ação filantrópica é desenvolvida em meio a dilemas morais que se manifestam em meio às histórias pessoais e de organizações. Ao invés de apelar para modelos deontológicos o que, segundo ela, implicaria em conceituar o pensamento ético e tentar aplicar regras mecanicamente, sua proposta é que decidamos "que regras aplicar numa determinada situação e se é um caso em que deveríamos seguir as regras diretamente ou abrir uma exceção." O modelo ético mais adequado para a tomada de decisões, propõe ainda Fischer, deve lançar mão de "padrões de narração de histórias... imaginando diferentes resultados potenciais e perguntando o que cada um significaria para a organização, a comunidade, e os indivíduos afetados." Ética, portanto, deve ser pensada no contexto de uma narrativa de modo a inserir as regras éticas dentro de um contexto apropriado. Fischer se esforça por evitar qualquer acusação de relativismo enfatizando que embora certas escolhas morais se situem no que se poderia denominar de área nebulosa, "algumas escolhas morais são "claramente certas ou erradas, e chamar a ética de nebulosa nestes casos é um modo de se esconder da responsabilidade e verdades éticas."

Então, quando quer que um real dilema ético surja, "pensar em ética como uma narração de histórias pode ser útil." No processo de contar nossa história para nós mesmos e para outras pessoas imaginativamente, "características proeminentes emergirão, enquanto detalhes menos importantes esmaecerão." Diálogo exercitado no contexto de uma cuidadosa investigação é evidentemente uma atividade central na reflexão ética. Conclui-se que o modelo proposto por Fischer possui pelo menos três características básicas: a importância da situação em um julgamento moral, a relevância do diálogo e da narração como ferramentas investigativas da decisão moral, e a avaliação dos resultados da decisão moral, podendo ser denominado um modelo situacional-narrativo-teleológico.

O diálogo como instrumento, coerente com a metodologia platônica, não implica, porém, necessariamente na adoção de um modelo ético fundamentado na situação e na narrativa, e no conseqüente afastamento de um modelo deontológico. Em algumas de suas obras, Platão evidencia que se pode lançar mão do diálogo como um recurso epistemológico para a identificação de um princípio moral, sem necessariamente afastar-se de um modelo deontológico. Ainda mais, a adoção de um modelo deontológico é compatível com o cultivo das virtudes, como a proposta aristotélica evidencia. Anderson dá suporte à legitimidade desta conclusão ao afirmar: Sem dúvida, Aristóteles está familiarizado com o conceito [de traçar linhas estabelecendo os limites da moralidade] e assumiu em seu pensamento sobre a Ética a convicção metafísica de que existem linhas inscritas na natureza das coisas às quais nossas próprias decisões e ações deveriam se conformar.

Em resumo, o reconhecimento da dificuldade inerente à tomada de algumas decisões morais, da importância do diálogo para a identificação da opção moral correta - ou pelo menos a que aparenta ser - e de uma ênfase ao cultivo das virtudes não são necessariamente incompatíveis com a adoção de um modelo ético deontológico fundamentado na lei moral revelada no Decálogo que, me parece, melhor expressa a tradição cristã em geral e a reformada em particular.

A análise de um caso hipotético pode ser útil na avaliação da aplicabilidade dos modelos acima descritos no contexto da captação de recursos. Por exemplo, um doador potencial deseja fazer uma doação significativa para uma escola com princípios evangélicos, digamos R$ 1 milhão. A única restrição imposta é que 50% do dinheiro seja destinado a bolsas de estudo para uma minoria gay. Que respostas os modelos éticos alternativos apresentados no artigo, a saber, o chamado situacional-narrativo-teleológico e o deontológico ofereceriam ao doador em questão?

O primeiro modelo requereria uma avaliação do contexto específico do doador e dos potenciais beneficiados por tal doação. A aplicabilidade ou não de regras a priori - supondo que elas existissem - deveria ser objeto de discussão, lançando-se mão da imaginação e considerando os diferentes resultados potenciais para as vidas dos envolvidos no processo de decisão. Em outras palavras, ainda que um conjunto de regras não recomendasse a aceitação da doação, fossem seus resultados concebidos como satisfatórios para um número significativo de pessoas beneficiadas - os membros da minoria gay que recebessem a bolsa - a legitimidade moral da decisão estaria assegurada.

No modelo deontológico, em contrapartida, a moralidade da decisão seria avaliada em termos independentes da situação. No caso do modelo deontológico proposto neste artigo, a aceitação da doação deveria ser avaliada com base na Lei Moral revelada no Decálogo, assumindo que a escola em questão explicitamente defina em sua declaração de missão seu compromisso com esta Lei Moral. À luz do Decálogo, seria moralmente não-permissível a aceitação da doação condicionada nos termos mencionados, porque, independentemente dos eventuais benefícios gerados, preceitos morais pré-estabelecidos estariam sendo quebrados. Na eventualidade, porém, da missão da escola não possuir um compromisso formal com os valores da Lei Moral expressa no Decálogo, mas conceber sua responsabilidade simplesmente em termos do desenvolvimento do ser humano, caberia ao órgão responsável pela direção da escola optar por uma dentre as seguintes alternativas: aceitar a oferta ou rever a declaração de missão.



Conclusão



Aristóteles estava correto. Decidir a quem, quanto, quando e para que propósito doar recursos financeiros - além de nosso tempo e talentos - não é uma coisa fácil. Dilemas morais surgirão neste processo que envolve a captação de recursos seja do ponto de vista da missão da organização destinatária, seja do ponto de vista do captador, ou das relações envolvendo doador e captador.

A atividade filantrópica baseada numa perspectiva antropológica que entende o ser humano como capaz de atos morais e de um caráter virtuoso encontra respaldo na Escritura e na teologia reformada e, conseqüentemente, deve ser valorizada e incentivada.

O tratamento das questões morais que inevitavelmente surgirão no processo de captação de recursos deverá levar em consideração o diálogo e enfatizar o cultivo das virtudes - altruísmo e integridade entre outras. Isto, porém, não significará necessariamente abrir mão de um modelo ético deontológico, baseado na lei moral revelada na Escritura, e mais especificamente no Decálogo. O apego - e porque não dizer, submissão - a esta lei moral nos permitirá acolher e nos relacionar com compaixão e boa vontade com doadores e/ou captadores como Maria Lugones, sem necessariamente definir integridade em termos teleológicos sujeitos a uma perspectiva individual e subjetiva.



ENGLISH ABSTRACT






The process of fundraising may be the source of some serious moral dilemmas concerning the mission of the organization which profits from the funds, the fundraiser, and even the relationship between the former and the latter.

The anthropological perspective - foundational to fundraising -, which sees human beings as capable of performing good moral acts and having a virtuous character, should be considered as grounded upon Scripture and Reformed theology as well. Consequently, both this perspective and philanthropy should be appraised and furthered.

Fundraising will require an emphasis on dialog and the cultivation of virtues from those dealing with its inherent moral issues. Such an emphasis, however, does not mean that one should dismiss a deontological model based on the moral law revealed in Scripture, and more specifically on the Decalog, as the foundation of moral decisions. The commitment - and even submission - to such deontological morality would allow the development of an ethics of fundraising that would avoid the adoption of alternative ethical systems in which moral decisions are made primarily on the basis of both the situation and the thelos to be achieved.



Notas






Neste ensaio, Ética é entendida como o estudo da Moralidade (no que tange ao seu escopo, modelo e fundamento), e esta última como responsável pela identificação das mores, ou critérios, segundo os quais ações devem ser julgadas permissíveis ou não, obrigatórias ou não. Reconhece-se, contudo, que freqüentemente os termos são usados de forma intercambiável como sinônimos. O autor é professor em tempo integral do Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper. É engenheiro civil pela Escola de Engenharia Mauá (1978). Bacherel em Teologia pelo Seminário Presbiteriano Rev. José Manoel da Conceição (1986), Mestre em Teologia Sistemática pelo Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper (1997) e Doutor em Filosofia (Ph.D., 2001) pelo Calvin Theological Seminary, em Grand Rapids, Michigan, EUA.. Autor dos artigos "Deus, Revelação e Ética: A teologia da Revelação de James Gustafson," Fides Reformata, vol. III, no. 2 (Julho-Dezembro 1998) e "Nicholas Wolterstorff e a Ética Social do Calvinismo Holandês," Fides Reformata et Semper Reformanda Est, vol. VI, no. 1 (2001). Foi pastor auxiliar da Igreja Presbiteriana Jardim de Oração por dois anos (1987-88) e pastor da Igreja Presbiteriana de Praia Grande (1989-1997). Atualmente, integra a equipe pastoral da Igreja Presbiteriana de Pirituba, em São Paulo, Capital.

Rae registra que o incêndio ocorrido em Methuen (Massachusetts), que feriu 24 pessoas e deixou 1400 trabalhadores desempregados, trouxe consigo o temor de que a cidade seria economicamente destruída. A despeito de seus 72 anos e de poder simplesmente aposentar-se com o dinheiro do seguro do incêndio, Feuerstein deu um bônus de Natal de US$ 275 a cada empregado mais US$ 20 para serem gastos num supermercado local. Ainda mais, ele propôs o pagamento do salário integral do próximo mês e de noventa dias do seguro-saúde, afirmando sua convicção de que as circunstâncias difíceis representavam um teste das suas convicções morais nas seguintes palavras: "Meu compromisso é com Massachusetts e com a Nova Inglaterra. É onde eu vivo, onde eu me divirto, e onde eu adoro [a Deus]. Malden Mills será reconstruída exatamente aqui..." Scott B. Rae and Kenman L Wong, Beyond Integrity. A Judeo-Christian Approach to Business Ethics (Grand Rapids, Zondervan Publishing House, 1996), p. 16.






Em sua decisão de produzir o medicamento para essa doença chamada river blindness, que afetava apenas populações ribeirinhas de países da África e das Américas Central e do Sul, a despeito da ausência de um retorno financeiro imediato, o laboratório Merck permaneceu coerente com um elemento chave da filosofia da companhia: "Nós tentaremos jamais esquecer que medicina é para as pessoas e não para o lucro. O lucro decorrerá [naturalmente] e se nós lembrarmos disso, ele nunca deixará de surgir. Quanto melhor nos lembramos disso, maior o lucro tem sido." Rae, Beyond Integrity, p. 17.


Rae, Beyond Integrity, p. 16.





Uma pesquisa da literatura disponível nas bibliotecas da Universidade Presbiteriana Mackenzie na área campo de Business Ethics revela a existência de 17 obras tratando de diferentes aspectos deste assunto: Business Ethics, 4th ed. (2002); Business Ethics: Critical Perspectives on Business and Management (2001); Business Ethics: Perspectives on the Practice of Theory (2001); Business Ethics: The Ethical Revolution of Minority Shareholders (2001); Ethics and Governance: Business as Mediating Institution (2001); Business, Institutions, and Ethics: A Text with Cases and Readings (2000); Just Business: Business Ethics in Action, 2nd ed. (2000); Managing Business Ethics: Straight Talk about how to do it Right. 2nd ed. (1999); It's Good Business: Ethics and Free Enterprise for the New Millennium (1997); Current Issues in Business Ethics (1997); Beyond Integrity. A Judeo-Christian Approach to Business Ethics (1996); Business and Society: Corporate Strategy, Public Policy, Ethics. 8th ed. (1996); Business Ethics: A Guide for Mangers (1996); An Introduction to Business Ethics (1996); Ties that Bind: A Social Contracts Approach to Business Ethics (1996); On Moral Business: Classical and Contemporary Resources for Ethics in Economic Life (1995).






Uma evidência deste fato é que a obra de Rae & Wong (Beyond Integrity) não dedica sequer uma de suas 655 páginas à Ética na Captação de Recursos. O mesmo pode ser dito da obra editada por Stackhouse e outros (On Moral Business) que apesar de seu valor e extensão (979 páginas) não dedica uma única seção ao tópico de nosso seminário.





Marilyn Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising (New York and others: John Wiley & Sons. Inc., 2000) e Albert Anderson, Ethics for Fundraisers (Bloomington: Indiana University Press, 1996). Outras obras mencionadas por Anderson como relevantes são Robert L. Payton, Philanthropy: Voluntary Action for the Public Good (New`York: American Council of Education, Macmillan, 1988), especialmente os ensaios "Philanthropy as Moral Discourse,"e "Virtue and its Consequences." Para uma pesquisa da extensão dos escritos sobre filantropia, consultar Daphne Niobe Layton, Philanthropy and Voluntarism (Washington, DC: Foundation Center, 1987 e Indiana Center on Philanthropy, que hospeda a Payton Philanthropic Studies Library, segundo Anderson - o autor destas indicações - "a maior coleção de livros e dissertações sobre filantropia na nação [norte-americana]." Anderson, Ethics for Fundraisers, p. 135.






Custódio Pereira. Captação de Recursos (Fund Raising). Conhecendo Melhor porque as Pessoas Contribuem (São Paulo: Editora Mackenzie, 2001).





Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 10. Cabe acrescentar que a filantropia não se restringe à doação de dinheiro, mas inclui a doação de tempo e talentos (ver Anderson, Ethics for Fundraisers, p. 15)



Brian O'Connell, Philanthropy in Action (New York: Foundation Center, 1987), p. 8 apud Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 10.

Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 10. Fischer lança mão da noção de uma economia baseada em doações como uma metáfora para a filantropia, recorrendo ao sistema de presentes (kula) existente lado a lado com o sistema de mercado (gimwali) nas Ilhas Trobriand.






Kula inclui "vastos círculos de doação ritual englobando muitas tribos e ilhas... O processo é caracterizado por um fluxo contínuo de presentes dados, aceitos e retribuídos em todas as direções obrigatoriamente sem qualquer interesse próprio, mas como conseqüência da grandeza e por serviços prestados, através de desafios e promessas (p. 11). No sistema descrito, reciprocidade direta não é esperada, tendo em vista que o receptor do presente deve passá-lo adiante, transformando-se num doador e beneficiando assim a outrem. Para mais detalhes da chamada economia baseada em doações, consultar pp. 13-16. Segundo Anderson, "o propósito último da filantropia é melhorar o bem público."


Ver Anderson, Ethics for Fundraisers, p. 9.


Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 15.


Pereira, Captação de Recursos, p. 22. O autor ainda ressalta que a maior parte dessas doações são provenientes de pessoas físicas. A título de informação, nos Estados Unidos, a AFP (Association of Fundraising Professionals) conta com 25 mil associados, o que evidencia o investimento feito na formação de captadores de recursos (ver Pereira, Captação de Recursos, p. 19). 



A principal razão para a diferença significativa entre o volume de recursos captados no Brasil e nos Estado Unidos, argumenta Pereira é "o método de captação de recursos. O método inclui desde a identificação do doador potencial, sua sensibilização para a causa até a efetivação da doação, prestação de contas e o reconhecimento da instituição recebedora." Pereira, Captação de Recursos, p. 23. Um exemplo de captação de recursos bem sucedido mencionado pelo mesmo autor é o da Harvard University que, numa campanha de cinco anos, conseguiu captar US$ 2.1 bilhões de dólares, contando com um quadro de pessoal de 250 funcionários no escritório de captação de recursos. A entidade evangélica norte-americana O Exército da Salvação captou mais de US$ 1 bilhão em 1996, situando-se pelo quinto ano consecutivo entre as 400 maiores obras de caridade segundo The Chronicle of Philanthropy [ver Christian Century (December 3, 1997):1118].



Pereira, Captação de Recursos, p. 45.



"Em 1999, a empresa [Instituto C&A] investiu quatro milhões de dólares em programas de apoio a mais de oitenta creches, escolas e centros de educação continuada. Cerca de 50 mil crianças e adolescentes foram atendidos pelo programa. Oitocentos funcionários da empresa atuam como voluntários nestas instituições. Uma vez por semana, são liberados para brincar com as crianças, ajudar na gestão e avaliar resultados." Pereira, Captação de Recursos, pp. 56-57. O Instituto Ethos de Responsabilidade Social conta hoje com 70 associados que representam juntos um faturamento anual de 15 bilhões de reais.

Cf. Christian Century, 28 de Agosto-4 de Setembro (1996):806.


Christian Century, August 28-September 4 (1996):p. 806.


Lucas nos oferece um outro exemplo da tensão moral envolvida na captação de recursos ao registrar em Atos 6 que os recursos levantados para o sustento das viúvas dos helenistas estariam alegadamente sendo desviados Fischer faz referência ao fato, mencionando o slogan que na língua inglesa possui uma rima: "As soon as [the] coin in coffer rings, the soul from purgatory springs." Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 38.






Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 22.



Ver 2 Coríntios 8. Outros textos neotestamentários que talvez se refiram à captação de recursos são Atos 6 e Filipenses 4. Não há, contudo, evidência textual nestes últimos casos de que os recursos tenham sido captados por iniciativa de alguém e não ofertados por iniciativa das comunidades envolvidas. A utilização de textos veterotestamentários que registram ordens de Deus aos israelitas para a pilhagem de povos derrotados está sendo conscientemente deixada de lado pelos mesmos enfocarem um contexto que foge ao escopo do presente ensaio.



A preocupação do apóstolo Paulo se evidencia quando ele afirma que sua intenção ao apontar Tito era estar "evitando, assim, que alguém nos acuse em face desta generosa dádiva administrada por nós; pois o que nos preocupa é procedermos honestamente, não só perante o Senhor, como também diante dos homens." (2 Coríntios 8:20-21) Paralelamente, mas em menor medida, recorrerei à obra de Anderson - Ethics for Fundraisers - identificando alguns pontos comuns explorados por aquele autor.



Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 3 (minha ênfase). A grande maioria de captadores de recursos, acrescenta ela, "quer agir com integridade e jamais violaria a confiança pública numa escala maciça." (p. 4)


Ibid., p. 4 (minha ênfase).


Ibid., p. 5 (minha ênfase).
"Quaisquer que sejam os motivos do doador, os padrões de doação não são egocêntricos porque eles não são dirigidos só ou primariamente para o benefício doador. Nem são filantrópicos porque os doadores participam das comunidades que tais doações criaram." Ibid., p. 12.
Ibid., p. 40.
Para Aristóteles, virtudes são traços de caráter firmemente estabelecidos ou disposições para agir segundo componentes intelectuais e afetivos. As virtudes se situam em uma posição intermediária entre dois extremos de deficiência e de excesso, sendo a razão a faculdade que determina esta posição intermediária (cf. Nicomachean Ethics). Não pertence ao escopo deste trabalho uma discussão aprofundada, nem uma avaliação comparativa entre o conceito de virtude em Aristóteles e em Tomás de Aquino (ver Suma Teológica, 5 volumes (Allen, Texas: Christian Classics, reimpr. 1981), 2:819 (Primeira Parte da Segunda Parte, Questão 55 e ss) Ibid., p. 44. Rae & Wong enfatizam a necessidade de virtudes como confiança, honestidade e cooperação como fundamentais para o próprio funcionamento do sistema capitalista, aliado ao caráter para a produção de boas ações. Em suas palavras, "os fundadores dos Estados Unidos criam que o experimento democrático funcionaria somente se houvesse virtude em seus cidadãos.
Ao contrário da crença popular, liberdade total nunca foi o intento dos pais fundadores. Ao invés sua visão era de liberdade 'ordeira' ou 'restringida' - ou seja, liberdade moderada pela moral e caráter." Rae, Beyond Integrity, p. 40. Anderson, a despeito de ressalvar que a cultura contemporânea se caracteriza por "uma ambigüidade moral onipresente," entende que há lugar para enfatizar a virtude no contexto da ação filantrópica. Anderson, Ethics for Fundraisers, p. ix. Na leitura que Anderson faz de Aristóteles, ser moralmente responsável no contexto da filantropia pressupõe o desenvolvimento de um caráter virtuoso. Anderson, Ethics for Fundraisers, p. x. Virtude é entendida como a capacidade para adotar uma linha de ação moderada que evita tanto o excesso quanto a deficiência (ver Anderson, Ethics for Fundraisers, p. 5)


Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 53. Segundo Monroe, uma pesquisa realizada com pessoas que abrigaram judeus da perseguição promovida pelos nazistas revelou que fatores como religião contexto familiar, riqueza, ocupação e posição familiar não foram determinantes na decisão de prestar socorro. Nas palavras de Fischer, "o mais interessante acerca dos resgatadores é que eles reivindicaram que não havia nada a decidir, não haviam alternativas entre as quais escolher." Ibid., p. 52.


Ibid., pp. 92-96. Ibid., p. 91. Ibid., p. 96. Ibid. Ibid. Do grego telos (fim). Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 97. Deontologia deriva do termo grego dei, que significa é necessário. Daí, concluem Rae & Wong, "vem a noção de obrigações morais que são inerentemente necessárias e não contingentes aos fins e conseqüências que elas produzem." Rae & Wong, Beyond Integrity, p. 35. Stackhouse, em Moral Business, afirma que Deontologia provém do grego deon, que significa dever, obrigação. A despeito das diferenças, Rae e Stackhouse propõem um mesmo conceito: Deontologia define as obrigações morais em termos de princípios pré-estabelecidos, que podem ser identificados através de diferentes recursos, mas em que a moralidade de um ato independe dos seus resultados. 






No entendimento de Anderson, o desafio dos agentes morais consiste em posicionar-se ante a pressão da cultura contemporânea, fazendo o que eles sentem que devem fazer (ver Anderson, Ethics for Fudraisers, p. xi) Ibid., p. 25.
O texto original afirma que nenhum ser humano é díkaios, ou seja, de acordo com o padrão, vontade ou caráter de Deus. Em outras palavras, nenhum ser humano é bom (outra tradução possível para o vocábulo grego díkaios) "The Heidelberg Catechism, Lord's Day 3, QA7," Ecumenical Creeds and Reformed Confessions (Grand Rapids: CRC Publications, 1988), p. 15 (minha tradução).



"The Heidelberg Catechism," Q/A 8, p. 15.


"The Belgic Confession," Ecumenical Creeds and Reformed Confessions (Grand Rapids: CRC Publications, 1988), p. 101 (minha tradução). A Confissão Belga deixa claro que estas obras não "contam para nossa justificação," mas decorrem dela.


Por "bem salvífico," os Cânones de Dort se referem a qualquer ato que possa ser considerado como suficiente para satisfazer o padrão de justiça de Deus e, conseqüentemente, merecedor de salvação.


"Canons of Dort," The Third and Fourth Points of Doctrine, Article 3," Ecumenical Creeds and Reformed Confessions, p. 133 (minha tradução).


"Canons of Dort," The Third and Fourth Points of Doctrine, Article 4," Ecumenical Creeds and Reformed Confessions, p. 133 (minha tradução e ênfase).
"Canons of Dort," The Third and Fourth Points of Doctrine, Article 4," Ecumenical Creeds and Reformed Confessions, p. 133 (minha tradução).
"The Heidelberg Catechism," Q/A 91, p. 54.


"Existe um tipo de entendimento das coisas terrenas e outro as coisas celestiais. Eu chamo "coisas terrenas" aquelas que não pertencem a Deus ou ao Seu reino, à verdadeira justiça, ou à felicidade da vida futura; mas que têm sua importância e relacionamento com a vida presente e são, num certo sentido, confinadas aos seus limites. Eu chamo de coisas celestiais o conhecimento puro de Deus, a natureza da verdadeira justiça e os mistérios do Reino Celestial. A primeira classe inclui o governo, o gerenciamento doméstico, todas as habilidades mecânicas e as artes liberais. João Calvino, Institutas da Religião Cristã, John T. McNeil, ed. (Philadelphia: The Westminster Press, 1960), II.ii.13, minha tradução.






Ibidem, II.ii.14, minha tradução.


Ibidem, II.ii.15, minha tradução.
Ibidem, minha tradução.


Stackhouse, On Moral Business, p. 31. Stackhouse não faz distinção entre graça comum e graça especial, razão pela qual ele lista ao lados dos elementos acima mencionados "uma comunidade religiosa que cura, inspira e guia todos que em a conhecê-la para a santidade do amor." Por detrás de tudo isto, um "único ponto integrador" deve ser reconhecido, a saber, Deus (p. 31).


Para Fischer "economias baseadas em doação podem refletir sistemas de fé profundamente baseados em pressuposições filosóficas, religiosas e cosmológicas." Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 13. Expressando suas convicções teológicas pessoais, a autora acrescenta que a "[h]istória não possui um grande senhor controlando o script..." (p. 10), rejeitando assim o ensino da Escritura de que Deus governa os detalhes da história - das nações e de indivíduos - através de um plano eternamente estabelecido (Isaías 46:9-11; Salmo 139:16).


"Caridade nos lembra de que doação filantrópica serve a ideais morais e religiosos e que tanto nossos compromissos interiores quanto nossas atividades exteriores deveriam exemplificar estes ideais." Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 58. Fischer parece sugerir que seres humanos são individualmente responsáveis somente ante si mesmos, a despeito da Escritura afirmar que "todas as coisas estão descobertas e patentes aos olhos daquele a quem temos de prestar contas." (Hebreus 4:13b, minha ênfase) Para uma breve, mas útil, perspectiva de diversos modelos (ou sistemas éticos), consultar Era & Wong, Beyond Integrity, onde os autores fazem menção ao Egoísmo Ético, Utilitarianismo, Emotivismo, algumas formas de Deontologia e à Teoria da Virtude.


A rigor, ela se refere ao que chamo de dilemas morais como "dilemas éticos" afirmando que "estes surgem nas histórias contínuas de pessoas e organizações." Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 5. Semelhantemente, Anderson, que a "natureza da ética, diferentemente da aritmética, é ser incerta." "Suas questões,"acrescenta, "escolhas e ações podem provocar o menear da cabeça, requerer consideração, consistência e determinação - sem perspectiva clara ou certa de que as decisões sejam totalmente certas." Anderson, Ethics for Fundraisers, p. xii.


Para uma definição de deontologia, consultar nota de rodapé 43.


"Conceituar o pensamento ético como apenas uma questão de aplicar regras a ocasiões específicas... é muito limitado.... Quando tentamos aplicar regras mecanicamente, podemos omitir a necessidade por um entendimento compassivo e esquecer que a aplicação própria de regras deve ser responsiva a características específicas do contexto e a peculiaridades de caráter." Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 9. "Teorias abstratas e tradições religiosas podem funcionar como recursos, ao invés de pontos de partida." Ibidem., p.


xvi. É questionável a tese defendida por Fischer de que a adoção de um modelo deontológico conduziria necessariamente a uma aplicação mecânica de regras.


Ibidem, p. 9.
Ibidem, p. 8. Fischer se refere positivamente ao filósofo John Dewey quando este afima que "Imaginação é o principalmente instrumento do bem." Os dilemas morais devem ser enfrentados com imaginação quanto às alternativas futuras, ao significado das mesmas para os indivíduos, organizações e comunidades envolvidas. Ainda mais, "a organização e os indivíduos devem ser imaginados como não estáticos, mas como mudando e crescendo." Conseqüentemente, um dilema moral deve ser encarado como "uma fase desse crescimento." Ibidem, p. 7-8. Anderson também enfatiza que ser eticamente responsável requer "imaginação moral." Anderson, Ethics for Fundraisers, p. xii.


Fischer, Ethical Decision Making in Fund Raising, p. 9.


"Algumas vezes em nossa reflexão ética, não vemos respostas claras, corretas; todas alternativa é tingida com negatividade, o mal mancha o bem." Ibidem, p. 19.


Literalmente, chamar ética de "cinza," cf. Ibidem, p. 19.
Ibidem, p. 19.
Ibidem, p. 8.


Ibidem, p. 24.


Ver, por exemplo, R. E. Allen, Plato's Euthypro and the Earlier Theory of Forms (New York: Humanities Press, 1970) e Plato, The Republic, Raymond Larson, transl. and ed. (Arlington: Harlan Davidson, Inc., 1979).


Nas palavras de Anderson, Anderson, Ethics for Fundraisers, p. 4. Paralelamente, o mesmo Aristóteles enfatiza a responsabilidade do ser humano no desenvolvimento de um caráter virtuoso, que significa concretamente buscar a moderação entre o excesso e a deficiência (ver Anderson, Ethics for Fundraisers, p. 5).



Na situação hipotética em questão, deliberadamente se evita a discussão de quaisquer implicações relacionadas a um eventual processo seletivo. A preocupação em pauta não é primariamente de ordem legal, mas moral.

Por resultados satisfatórios, entendam-se benefícios reais e legítimos oriundos da concessão da bolsa como, por exemplo, o desenvolvimento pessoal dos beneficiados, a perspectiva de uma contribuição à sociedade em suas áreas específicas de preparo acadêmico, entre outros.

Revista Fides Reformata
http://www.mackenzie.com.br/teologia/


1   2   3   4   5   6   7   8

Nenhum comentário:

Postar um comentário