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sábado, 16 de janeiro de 2010

Teologia do Antigo Testamento

Teologia do Antigo Testamento
Parte I

 Uma das primeiras preocupações de Walter Kaiser é discutir se de fato existe a possibilidade de uma teologia do Antigo Testamento. Para analisar esta questão, o autor faz uma apresentação das posições adotadas por grandes teólogos do AT neste século, como Walter Eichrodt, Theology of the Old Testament (Londres: SCM, 1961) e Gerhard von Rad, Teologia do Antigo Testamento, 2 vols. (SP: ASTE, 1986).

Eichrodt fez um ataque violento contra o historicismo. Alegava que a coerência interior do AT e do NT tinha sido reduzida a um tênue fio de conexão histórica e seqüencial, causal, entre os dois testamentos, que resultava de uma causalidade externa.

Já von Rad não somente negava qualquer fundamento histórico genuíno para a confissão de fé de Israel, como também tinha mudado o objeto do estudo teológico de uma focalização sobre a palavra de Deus e sua obra para os conceitos religiosos do povo de Deus. O objeto e enfoque da teologia do Antigo Testamento tinham sido mudados da história como evento e da palavra como revelação para uma abordagem tipo história da religião.

Assim, Kaiser vai mostrar que a natureza da teologia do AT não é somente uma teologia que está em conformidade com a Bíblia inteira, mas é aquela que se descreve e se contém na Bíblia. Essa teologia expressa uma vinculação real com os períodos históricos que compreendem a história de Israel, onde cada contexto antecedente e mais antigo se torna a base para a teologia que vem a seguir. Dessa maneira, para Kaiser, na teologia do Antigo Testamento a estrutura está colocada historicamente e seu conteúdo se encontra exegeticamente controlado. Como conseqüência, a teologia do AT em Kaiser tem um centro e conceitualização unificadas e traduzidas nas descrições, explanações e conexões do texto sagrado.

Ao procurar identificar as teologias do AT, Kaiser vai trabalhar com quatro variáveis:

1. A teologia estrutural, que descreve o esboço básico do pensamento e da crença do AT em unidades tiradas por empréstimo da teologia sistemática, da sociologia, ou de princípios selecionados, e depois arma seus relacionamentos com conceitos secundários. Eichrodt e Th. C. Vriezen, An Outline of Old Testament Theology (Newton, Mass.: Charles T. Branford Co. 1970) pode sem enquadrados na teologia estrutural. Para Kaiser, essa teologia não tem autonomia, existindo apenas como função heurística da teologia sistemática.

2. A teologia diacrônica que expõe a crença dos sucessivos períodos e das estratificações da história de Israel, colocando a ênfase sobre as tradições sucessivas da fé e da experiência da comunidade religiosa. Von Rad é seu grande expoente. Para Kaiser, não estamos diante de uma teologia do AT, mas diante de uma história da religião de Israel.

3. A teologia lexicográfica, que limita sua investigação a um grupo ou a grupos de personalidades bíblicas, analisando seu vocabulário teológico especial, como por exemplo, os sábios, o eloísta, o vocabulário sacerdotal, etc. Gerhard Kittel, editor, G. W. Bromiley, trad., Theological Dictionary of the New Testament, 10 vols. (Grand Rapids: Eerdmans, 1964-74); Peter F. Ellis, The Yahwist: the Bible's First Theologian (Notre Dame: Fides Publishers, 1968). 




4. E por fim a teologia de temas bíblicos, que leva sua busca além do vocabulário de personagens, para abranger uma constelação de palavras que gira ao redor de um tema chave. Aqui se coloca o próprio Kaiser.

O enquadramento da teologia do AT

Outra questão colocada por Kaiser é a que se refere ao enquadramento da teologia do AT. Deve-se incluir material alheio ao cânone, como apócrifos, textos da biblioteca de Qunram ou comentários do Talmude? Para Kaiser a utilização de material alheio ao texto debilitariam o propósito de discutir a feição integral da teologia dentro de uma corrente da revelação. Toma como exemplo a pregação de Jesus que, considera Kaiser, trabalhou apenas com os textos enquadrados no cânone judaico.

Assim, para Kaiser, a teologia deve ser bíblica e não precisa repetir cada detalhe do cânone para ser autêntica e exata. O método deve sintetizar os detalhes que parecem discrepantes, a fim de termos, então, uma única teologia bíblica embalada sob a etiqueta de dois testamentos.

O que move a teologia do AT?

O texto pede para ser entendido e colocado num contexto de eventos e significados. Os estudos históricos colocam o exegeta em contato com os fluxo de eventos no tempo e no espaço. As análises gramaticais e sintáticas identificam a coleção de idéias no período histórico sob investigação. Assim, as raízes históricas da mensagem em seu desenvolvimento e o julgamento das avaliações normativas do texto traduzem o propósito e o papel da teologia bíblica.

A motivação maior é entender o texto enquanto texto colocado num contexto de significados. É assim, considera Kaiser, que a teologia bíblica sua grande contribuição, especial e peculiar.


E o centro canônico, existe ou não?


Kaiser levanta algumas perguntas: existe uma chave para uma organização metódica e progressiva de assuntos, temas e ensinos do Antigo Testamento? Os escritores do AT tinham consciência dessa organização quando acrescentavam algo a essa corrente histórica da revelação?

E conclui que as respostas a seus questionamentos definirão o destino e a direção da teologia do AT. Caso seja impossível responder positivamente as duas perguntas, então, somos obrigados a falar de diferentes teologias do AT, no sentido de variedade ou de linhas de continuidade que acontecem dentro de tendências de diversidade. Mas para Kaiser isso não acontece: os escritores bíblicos reivindicam a posse da intencionalidade divina na sua seletividade e interpretação daquilo que foi registrado e nós não podemos negar essa realidade.

Por isso Kaiser defende a realidade do centro canônico. Considera, porém, que a maioria dos teólogos erra ao definir um centro apriorístico, externo, e tentar enquadrar o conteúdo do AT nele. A metodologia deve partir de uma exegese cuidadosa, evitando todo e qualquer encaixe precipitado.

Até a década de 70, a maioria dos teólogos considerava que a história era o veículo da revelação divina no AT. Aquilo que se conhecia de Deus era conhecido através da história. Outros, no entanto, argumentavam que a revelação verbal tinha tanto direito quanto a história de ocupar o centro do palco teológico. A fé de Israel, assim como a teologia bíblica, tinha de Ter como seu objeto não os atos de Deus na história, mas aquilo que o povo confessava, não importa a veracidade primeira dos acontecimentos. A essa afirmação, um teólogo católico, Roland de Vaux, Historia antigua de Israel, 2 vols. (Madri, Cristiandad, 1975) - id., Instituciones del Antiguo Testamento (Barcelona, Herder, 1976) argumenta: "A interpretação da história dada é verdadeira e tem origem em Deus ou não é digna da fé de Israel e da nossa".

O mais importante, para Kaiser, é a conexão entre a reivindicação divina - o ter anunciado muito antes de ter acontecido o curso dos eventos - e o fato de que isso estava de acordo com seu plano e propósito. E os escritores bíblicos tinham a palavra divina e o juramento divino de promessa.

Esse é o centro canônico que Kaiser vai devolver em sua obra, depois de uma ampla e bem defendida exposição metodológica. Trabalhando a partir dessa metodologia, Kaiser constrói sua teologia bíblica, organizando o cânone a partir das promessas de Deus ou daquelas passagens onde considera que Deus acrescentou seu compromisso ou juramento.

[Teologia do Antigo Testamento, Walter C. Kaiser Jr., tradução de Gordon Chown, SP, Edições Vida Nova, 1997, pp. 2 a 56].

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